INTRODUÇÃO
Inicio
com este texto uma pequena série relacionada a uma das questões mais delicadas
no meio do protestantismo mundial e nacional – a questão da ruptura eclesiástica.
Quando falamos de protestantismo [1] imediatamente
somos arremetidos para a Reforma Protestante ocorrido no século XVI, cuja uma
de suas máximas foi “Ecclesia Reformata
semper est reformando” (a igreja
reformada sempre está se reformando),[2] que soa romanticamente aos ouvidos
como uma proposta de humilde disposição em permanentemente reexaminar posições
e opções e de forma conciliar e harmoniosa buscar se adequar aos novos tempos e
novas perspectivas.
Entretanto,
quer seja nos primórdios da Reforma, como nos séculos posteriores ou ainda
neste momento histórico, este lema forjado na bigorna reformada, nunca deixou de ser uma utopia, pois em
qualquer época em que por alguma razão ou motivo se propôs qualquer que seja as
mudanças nas esferas eclesiástica ou teológica, sempre se encontrou no meio
protestante uma atitude de intransigência
e intolerância, culminando sempre em
um processo de ruptura, desprezando
quase completamente toda e qualquer possibilidade de uma conciliação de novas
ideias e mudanças.
Torna-se relevante estes artigos, ainda que seja tão
somente uma análise introdutória sobre o tema, pois oferece uma revisão
histórica desta síndrome cismática do protestantismo que permeia também seus
ramos transplantados no Brasil, nos possibilitando uma avaliação e autocrítica
da nossa própria herança e, por conseguinte, a um enriquecimento profundo da
vivência da fé evangélico-protestante.
Como
cientista da religião a análise critica com que estes textos foram elaborados
não trás em si qualquer ressentimento ou desejo de depreciar o legado
protestante brasileiro, ao contrário, o esforço é fazer um retrospecto
histórico que permite aos protestantes brasileiros compreenderem, discernirem e
acolherem com maior firmeza por novos ângulos sua própria experiência cristã
atual.
No primeiro momento procuro fazer uma retrospectiva
histórica do movimento reformado e suas primeiras cismas. Darei uma maior
atenção na Reforma ocorrida na Inglaterra, visto ser ela a célula mater das representações reformadas
que haverão de se instalar em nosso país.[3]
Saindo
da Inglaterra temos que passar, ainda que rapidamente, pelo hemisfério norte,
pois com seu desenvolvimento do conceito
denominacional haverá de cristalizar definitivamente a ruptura como a via
mais fácil para todo e qualquer impasse eclesiástico/teológico.
Quando
nos transportamos para o Brasil
haveremos, com facilidade, de identificar desde seus primórdios, diversos ramos
protestantes se empenhando simultaneamente, mas
não conjuntamente, para se instalarem no país.[4] Sendo um destes ramos o
presbiterianismo e que ainda em sua formação primitiva produz e reproduz em seu
seio uma sequência de rupturas motivadas por divergências eclesiásticas e
teológicas.
Acredito que esta série de artigos trará uma singela
contribuição para o grande esforço que se faz no Brasil desde a década de 70 do
século XX, por meio de seus centros acadêmicos, de se fazer uma abordagem
despida de apologética e eufemismo, no que concerne ao campo religioso
brasileiro, reforçando importância dos estudos sobre religião e a sua relação
com a cultura e sociedade contemporânea.
Entretanto, ainda que muitos estudiosos acabem por
se tornarem um tanto céticos quanto às mudanças que possam vir a ser efetuadas
na pratica da instituição ou mesmo no “modus vivendi” de suas lideranças,
compartilho da expectativa romântica de nosso querido pesquisador da religião, Antônio G. Mendonça, que ao escrever sua tese sobre a questão cúltica evangélica trouxe uma contribuição inegável para expansão das fronteiras
do estudo do protestantismo brasileiro, ele declara que desejava “contribuir para a
crítica – e se possível para a renovação – do culto protestante no Brasil”
(1990, p. 146). Minha modesta contribuição com estes textos esta também gestada
desta romântica esperança, que nos permite olhar o futuro com um pouco menos de
pessimismo.
Utilização livre desde que citando a fonte
Guedes, Ivan Pereira
Mestre em Ciências da Religião
ivanpgds@gmail.com
MENDONÇA, Antonio Gouvêia. O celeste porvir - a inserção do protestantismo
no Brasil. São Paulo: Ed. Paulinas, 1990.
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[1] O termo "protestante" tem origem no protesto de seis príncipes luteranos e 14 cidades alemãs em 19 de abril de 1529. quando a segunda dieta de Speyer. convocada pelo imperador Carlos V, revogou uma autorização concedida três anos antes para que cada príncipe determinasse a religião de seu próprio território. O termo foi logo adotado, de início pelos católicos e logo a seguir pelos próprios partidários da Reforma, pois seu protesto, entendido como uma rejeição à autoridade de Roma, constituiu um claro sinal às diversas igrejas que se declaravam reformadas.
[2]Esta expressão (em latim) quer significar que a Igreja deve estar em contínuo processo de atualização e contextualização da mensagem cristã para enfrentar os desafios do mundo contemporâneo e os dilemas do ser humano moderno. Sua autoria é atribuída a um teólogo holandês chamado Gisbertus Voetius (1589-1676), e foi elaborada no contexto das ardentes discussões do Sínodo de Dort (1618-1619), realizado pela Igreja Reformada Holandesa (na cidade de Dordrecht), evento demarcante da grande cisão teológica vigente até hoje entre calvinistas e arminianos.
[3] A processo de Reforma na Inglaterra dará origem à Igreja Anglicana comandada pelo rei. Esta foi a primeira igreja protestante autorizada pelo então rei Dom João VI, no período em que a Corte Portuguesa se instalou no Brasil fugindo de Napoleão e seus exércitos, a praticarem livremente sua forma de culto e também coube a eles a construção do primeiro templo protestante no país.
[2]Esta expressão (em latim) quer significar que a Igreja deve estar em contínuo processo de atualização e contextualização da mensagem cristã para enfrentar os desafios do mundo contemporâneo e os dilemas do ser humano moderno. Sua autoria é atribuída a um teólogo holandês chamado Gisbertus Voetius (1589-1676), e foi elaborada no contexto das ardentes discussões do Sínodo de Dort (1618-1619), realizado pela Igreja Reformada Holandesa (na cidade de Dordrecht), evento demarcante da grande cisão teológica vigente até hoje entre calvinistas e arminianos.
[3] A processo de Reforma na Inglaterra dará origem à Igreja Anglicana comandada pelo rei. Esta foi a primeira igreja protestante autorizada pelo então rei Dom João VI, no período em que a Corte Portuguesa se instalou no Brasil fugindo de Napoleão e seus exércitos, a praticarem livremente sua forma de culto e também coube a eles a construção do primeiro templo protestante no país.
[4] As primeiras denominações protestantes a se estabelecerem de fato no Brasil foram: Episcopais, Congregacionais, Metodistas, Presbiterianos, Batistas, chamadas também de igrejas históricas, para se diferenciar das demais denominações que foram implantadas ou surgiram em um período posterior. Nos primeiros cinquenta anos o presbiterianismo expandiu fortemente no país, porém, na pratica antropofágica em consequência das rupturas internas, perdeu sua pujança e dinamismo.
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