A cidade do Rio de Janeiro vista da baia da Guanabara
gravura de Henry Chamberlain
Contexto Brasileiro
O Presbiterianismo
estabelece-se no Brasil eclesiasticamente, após alguns esforços pessoais, em 1859
com a chegada do missionário americano Ashbel Green Simonton dando origem a Igreja
Presbiteriana do Brasil.
Nos cinquenta anos que
antecedem a chegada de Simonton, principalmente nos dez últimos, o Brasil
experimenta uma profunda e continua metamorfose em todas suas esferas sociais,
que haverão de transformar e alterar definitivamente sua trajetória histórica e
principalmente no que concerne à religião. Podemos dizer que estes anos se
constituíram em um período de maturação, para a inserção definitiva do
protestantismo presbiteriano na história e na vida dos brasileiros, que perdura
até os dias atuais, com todas suas implicações nas mais distintas esferas
sociais.
Quando
Simonton chega ao Brasil o protestantismo já se fazia presente no contexto
social e na mentalidade de grande parte dos brasileiros. Afora as duas
frustradas e distantes tentativas de um protestantismo invasor pelos Franceses e depois pelos Holandeses, já possuem uma relativa bibliografia a ser consultada (MATOS, 2008, pp. 84-93; LESSA,
1938, p. 11ss.; SCHALKWIJK, Frans Leonard, 2004, obra clássica sobre a invasão
holandesa).
As Primeiras Aberturas ao Protestantismo
Desde
1808 com a transferência da Corte portuguesa para o Brasil, debaixo da proteção
inglesa, e a simultânea abertura dos portos brasileiros aos países amigos, o
país se abriria definitivamente para outras nacionalidades e evidentemente suas
respectivas religiões.
O
“Tratado de Comércio e Navegação” (1810) em seu Artigo XII (REILY, 1993, pp.
40-41), firmado por Dom João VI com a Inglaterra, vai permitir a prática religiosa
anglicana [igreja estatal inglesa] possibilitando assim, de maneira inédita, que pregações protestantes sejam
feitas legalmente no país, ainda que restrita aos estrangeiros.
Em
1818 imigrantes alemães se instalaram na cidade de Friburgo, no Rio de Janeiro,
e posteriormente expandiram pela região sul do país (RIBEIRO, 1973 capto 4; DREHER,
1984, p. 38s.; WITT, 1996). Em decorrência direta desta opção pela imigração
europeia, de cunho protestante, em detrimento de outras populações, de origem
católica, em 1824 a primeira Constituição Brasileira é promulgada e insere em
seu Artigo 5°:
A Religião Católica Romana continuará a ser a Religião do
Império. Todas as outras religiões serão permitidas com seu culto doméstico ou
particular, em casas para isso destinadas, sem forma alguma exterior de templo.
As Sociedades Bíblicas e a Colportagem
As Sociedades Bíblicas,
tanto a Britânica quanto a Americana[1]
- começam a enviar seus “agentes” e “colporteurs”[2]
que viajam milhares de quilômetros por todo o Brasil distribuindo [vendendo] Bíblias, bem
como outros panfletos contendo a mensagem evangélica protestante. Como afirma
Matos: “As primeiras organizações protestantes que direcionaram os seus
esforços para suprir as necessidades espirituais dos brasileiros não foram as
igrejas, mas as sociedades bíblicas”. (2008, p. 101).[3]
A expansão extremamente rápida
e profícua do protestantismo no Brasil é devedora em alto grau às atividades
continua da denominada colportagem, que foi exercida inicialmente pelos primeiros
missionários[4] e
posteriormente por centenas de leigos brasileiros que percorreram todo o país, saindo
dos grandes centros urbanos e chegando aos lugares mais distantes e às vilas
mais acanhadas, oferecendo bíblias e comunicando a mensagem evangélica pela
perspectiva protestante. O professor Calebe Soares, que conta em detalhes o desenvolvimento desta
atividade no Brasil, registra que o esforço incessante dos colportores
tornou-se logo cedo motivo de preocupação por parte das lideranças católicas,
conforme se percebe nas palavras do padre Agnelo Rossi ao fazer uma definição dos
colportores:
Tradução do vocábulo anglo-gálico colporteurs. São os propagandistas viajantes que, de povoação em
povoação, de casa em casa, vão desenvolvendo uma propaganda ativíssima com a
venda de Bíblias e opúsculos evangélicos, e com a distribuição de folhetos de
propaganda. Ordinariamente, são homens peritos em convencer, com termos sonoros
e lábia invulgar. Servem muitas vezes de meio utilíssimo para fundação de novos
centros protestantes. Observadores perspicazes,
eles sondam o terreno onde sua propaganda é mais ou menos eficaz e informam as seitas sobre as possibilidades dos
locais percorridos. (1939, pp. 146-47, Apud
SOARES, 1996, p.15 - Itálico meu).
Alguns
destes primeiros observadores perspicazes estrangeiros escreveram suas reminiscências
sobre o país e despertaram um crescente interesse por parte de seus concidadãos
em relação ao Brasil. Um dos mais populares foi escrito por um missionário
metodista americano Daniel P. Kidder – “Reminiscências de Viagens e
Permanências no Brasil” (1972) que vai influenciar muito um pastor
presbiteriano, James C. Fletcher, que atuara de forma efetiva no país por mais
de dez anos e que atualizando as informações anteriormente editadas por Kidder,
vai editar um novo livro com o título de “O Brasil e os Brasileiros” que terá
sua primeira edição em inglês em 1857 e reedições atualizadas em 1866, 1867 e 1868,
sendo que nas últimas edições foi inserido um capítulo especialmente voltado
para os possíveis imigrantes sulistas do pós-guerra civil americana, tendo
também algumas edições em português. (VIEIRA, 1980). Os livros de Kidder e
Fletcher, conforme Ribeiro vai fixar na mente dos norte-americanos uma imagem
bastante positiva do Brasil e principalmente em ser “acessível aos
protestantes” e “como ‘país de Missão", ao quais as igrejas protestantes deviam
enviar missionários. (1981, p. 14).
Utilização
livre desde que citando a fonte
Guedes, Ivan Pereira
Mestre em
Ciências da Religião.
Universidade
Presbiteriana Mackenzie
me.ivanguedes@gmail.com
Outro Blog
Reflexão Bíblica
http://reflexaobiblica.spaceblog.com.br/
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Referências Bibliográficas
DREHER, Martin Norberto. Igreja e Germanidade. São Leopoldo: Sinodal/EST, 1984.
GUEDES, Ivan Pereira. O protestantismo na cidade de São Paulo – presbiterianismo: primórdios e desenvolvimento do presbiterianismo. Alemanha: Ed. Novas Edições Acadêmicas, 2013.
KIDDER, Daniel P. Reminiscências de viagens e permanências no Brasil [1842]. Tradução
de Moacir N. Vasconcelos. São Paulo: Livraria Martins/ Edusp, 1972.
_______________ e FLETCHER, James C. O Brasil e os
brasileiros (esboço histórico e descritivo). São Paulo: Companhia Editora
Nacional. 1941.
LESSA, Vicente Themudo. Annaes da Primeira Egreja Presbyteriana de São Paulo – Subsídios para a História do Presbiterianismo Brasileiro. São Paulo: Ed. Primeira Igreja Presbiteriana Independente de São Paulo, 1938.
MATOS, Alderi Souza
de. Erasmo
Braga, o protestantismo e a sociedade brasileira – perspectivas sobre a missão
da igreja. São Paulo: Editora Cultura Cristã, 2008.
REILY, Duncan Alexander. História documental do protestantismo no Brasil. 2ª impr. rev. São
Paulo; ASTE, 1984.
RIBEIRO, Boanerges. Protestantismo no Brasil monárquico (1822-1888): aspectos culturais da
aceitação do protestantismo no Brasil. São Paulo: Pioneira, 1973.
_________________. Protestantismo
e cultura brasileira – aspectos culturais da implantação do protestantismo no
Brasil. São Paulo: Casa Editora Presbiteriana, 1981.
RIZZO, Maria Amélia. Simonton – inspirações de uma existência. São Paulo: Editora Rizzo,
1962.
ROCHA, João Gomes. Lembranças do passado – Ensaio histórico do inicio do trabalho
evangélico no Brasil, do qual resultou a fundação da Igreja Evangélica Fluminense
pelo Dr. Robert Reid Kalley. Rio de Janeiro: Centro Brasileiro de
Publicidade Ltda, vol. 1, 1941.
SCHALKWIJK, Frans Leonard. Igreja e Estado no Brasil holandês (1630 a 1654), 3ª ed. São Paulo: Cultura Cristã, 2004 (1986).
SOARES, Caleb. Januário Antônio dos Pés Formosos. Campinas (SP): Luz Para o Caminho, 1996.
WITT, Osmar Luiz. Igreja na migração e colonização. São Leopoldo: Sinodal, 1996 148
p. -- (Série Teses e Dissertações; 8) 1. Brasil — Rio Grande do Sul - Igreja
Luterana. I. Título. II. Série.
VIEIRA, David Gueiros. O protestantismo, a maçonaria e a questão religiosa no Brasil. Brasília:
Editora da Universidade de Brasília, 1980.
[1] A Sociedade
Bíblica Britânica e Estrangeira foi fundada em 1804 e a Sociedade Bíblica
Americana em 1816. A Britânica e Estrangeira enviou diversos representantes que
percorreram não só o Brasil, mas toda a América Latina e a Sociedade Americana
enviaram missionários que passaram a residir no Brasil.
[2] Ao menos no
Brasil criou-se uma distinção técnica entre “agente” e “colporteurs e/ou
colportor”. O
primeiro tinha nível superior e era
o representante nacional da instituição; o segundo se caracterizou
como o distribuidor
e vendedor ambulante de impressos protestante e geralmente tinha formação escolar
primária. (Rocha, s/d, vol. 1, p. 199).
[3] As sociedades bíblicas eram
entidades mundiais que tinham como finalidade a divulgação integral ou parcial da
Bíblia na língua vernácula de cada povo. Antes mesmo de estabelecerem agências no Brasil,
iniciaram um trabalho de divulgação e propagação das idéias protestantes no país nas primeiras décadas
do século XIX, expedindo Bíblias e Novos Testamentos através da embaixada inglesa, por
portadores diretos, por comerciantes, pelos comandantes de navios que zarpavam dos Estados
Unidos. Em 1842, a BFBS e a ABS se fundiram no Brasil e, seis anos mais tarde,
foi organizada a Sociedade Bíblica do Brasil. (Reily, 1984, pp. 54, 59).
[4] Simonton nas
anotações em seu diário entre 22 de outubro de 1860 a 14 de fevereiro de 1861
menciona ao menos oito referências relacionadas à Bíblia. Registra a abertura
de um depósito de Bíblias no Rio de Janeiro, a distribuição de Bíblias por meio
de colportores de Campinas e Sorocaba e registra a ousada conversa que teve com dois padres na casa do
major Paulino íris, em Itapetininga, SP, sobre este tema delicado para o pensamento católico da época, falando da
necessidade de colocar
a Bíblia nas mãos do povo, uma tradição
muito forte dos
protestantes desde a Reforma, no principio do século XVI. (RIZZO, 1962,
p. 72-76).
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