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sexta-feira, 18 de novembro de 2022

História da Igreja: A Comunidade de Reinos no Medievo

 

"Quando falamos de sabedoria, estamos a falar de Cristo. Quando falamos sobre a virtude, estamos a falar de Cristo. Quando falamos de justiça, estamos a falar de Cristo. Quando estamos a falar de verdade e de vida e redenção, estamos falando a respeito de Cristo "

O longo período de mil anos entre os séculos V e XV é o palco da ascensão e queda da Comunidade Medieval Europeia. Como vimos o caos causado pela queda do Império Romano, proporcionou à Igreja Cristã ascender ao topo do poder. Na mesma proporção em que os povos bárbaros conquistadores foram sendo cristianizados, a Igreja vai moldando todo o Ocidente à imagem e semelhança dos ideais cristãos [não necessariamente de Jesus Cristo] da vida comum das pessoas. Sobre os escombros do desaparecido Império Romano, o cristianismo vai construindo uma nova ordem social e uma política civilizadora, um "mundo único" cristão onde a unidade dos homens no Corpo de Cristo se expressava em dois aspectos: espiritual na Igreja universal e material/temporal no Império medieval.

Ainda que a Idade Média tenha recebido um triste apelido pejorativo de “Idade das Trevas”, e de fato do meio para o fim deste período as suas instituições tenham de fato entrado em convulsões morais e espirituais que acabaram desembocando no grande movimento da Reforma Protestante. Entretanto, nos dias de sua grandeza, nenhuma época produziu um senso mais elevado de dever e maior disposição para se sacrificar, ou uma concepção mais refinada da fraternidade comum entre as pessoas sob uma única ordem mundial cristã.

Liderança Cristã em um Mundo em Transformação

Os fundamentos sobre os quais a nova Europa haveria de ser construída serão estabelecidos pelos arquitetos da Comunidade Medieval, os líderes cristãos dos séculos IV e V. Dois personagens tornam-se representativos desse momento crucial e formativo, que no pensamento e na ação construíram a ponte sobre a qual o mundo Antigo passou para a Idade Média.

Ambrósio de Milão (339-397)[1]: governador vigoroso e hábil da cidade, exegeta bíblico, teórico político, mestre da eloquência Latina, músico e professor; em todos esses papéis, ele estava falando a respeito de Cristo. Embora o poder e a independência crescentes da Igreja na época de Ambrósio fossem reforçados pela legislação imperial, foi o trabalho de homens como ele que fizeram da organização cristã a única instituição estável na cena em mudança.

Foi firme nas questões concernentes às práticas pagãs; foi implacável em relação ao arianismo, que havia avançado bastante; e coroando sua postura singular enfrentou o imperador Teodósio I, o último imperador forte no Ocidente. E foi nesse embate entre os dois maiores poderes daquele momento que Ambrósio apresentou os princípios da relação entre Igreja e Estado que se constituirá na bússola norteadora do pensamento medieval.

Em 390 a.C. Teodósio ordenou um massacre de sete mil moradores de Tessalônica, horrorizando todo o mundo mediterrâneo. Depois disso, o imperador vai à basílica de Milão, no que foi impedido pelo bispo Ambrósio de participar dos sacramentos, até que houvesse demonstrado arrependimento. Nesse momento a Igreja e o Estado pararam! Mas o imperador acata a autoridade da Igreja e se retira acatando a pena que lhe foi imposta pelo bispo.

No pensamento de Ambrósio, a Igreja e no Estado se constituem dois poderes que se apoiam, mas independentes, um funcionando na esfera espiritual, o outro nos assuntos temporais. Quanto à religião, o dever do Estado ou do imperador cristão é proteger e apoiar a Igreja, fazer cumprir as decisões de seus conselhos ecumênicos e elaborar um código legislativo de acordo com os princípios morais cristãos.

Qualquer ação além dessas torna-se interferência. A independência da Igreja em relação à sua propriedade e à sua lei, bem como os privilégios e poderes do seu clero, devem ser respeitados e garantidos. Aqui, está a síntese do pensamento que determinou a relação da Igreja e do Estado no início da Idade Média, antes da imposição do poder supremo e universal do papado tornar-se dominante no Ocidente.

O pensamento vitorioso de Ambrósio está em nítida distinção com o princípio aceito na metade oriental do antigo império. Lá o conceito dos poderes divinamente dados do imperador, onde tanto a Igreja quanto o Estado estão debaixo de sua autoridade, era já difundido e cristalizado. Desta forma, o abismo entre a parte Oriental do cristianismo e seu lado Ocidental vai cada vez mais sendo ampliado, em decorrência dessas visões opostas da relação entre os poderes espirituais e temporais cristãos.

O Legado de Ambrósio

            Entre muito que poderíamos destacar na vida de Ambrósio uma que se reveste de particular atenção é a sua participação efetiva na conversão de Agostinho, cuja influência sobre o pensamento e a vida da igreja até aos dias de hoje é difícil de exagerar. Não somente as exposições bíblicas de Ambrósio, mas a amalgama com sua vida cristã piedosa atraíram e impactaram a vida do jovem Agostinho que sempre se refere a ele como muito apreço, como por exemplo, em suas Confissões:

“A Milão vim, ao Bispo Ambrósio ... cujo discurso eloquente dispensou abundantemente a Teu povo a farinha de Teu trigo, a alegria de Teu óleo e a sóbria embriaguez de Teu vinho. Por ele eu fui guiado por Ti sem saber, para que por ele eu pudesse ser conduzido a Ti conscientemente. Aquele homem de Deus me recebeu como um pai e mostrou-me uma bondade episcopal em minha vinda” (Confissões, livro 5 - itálico meu).

            Ele foi sem duvida alguma um baluarte na vitória da Ortodoxia Cristã contra as heresias produzidas principalmente pelo Arianismo. Tornou-se um exemplo em permanecer firme contra a arrogância de poderosos que praticavam atrocidades, incluindo o próprio Imperador. Ele não se encolheu diante dos poderosos ou ricos, mas manteve-se dentro dos padrões de justiça. Tal coragem é digna de emulação.

            Suas teses da relação entre igreja e o Estado em que ambos tinham suas esferas de autoridade e poder distintos foi ainda no nascedouro deturpado, inclusive por ele mesmo ao tomar ações que sobrepunham a igreja sobre o Estado. O que ao longo da Idade Média transformara a igreja em autoridade maior sobre todas as outras e reis e imperadores sucumbiriam diante dela. Mas este poder excedente acabou por deformar completamente a função da igreja trazendo danos irreparáveis à espiritualidade eclesiástica.

 

 Utilização livre desde que citando a fonte
Guedes, Ivan Pereira
Mestre em Ciências da Religião.
Universidade Presbiteriana Mackenzie
Outro Blog
Reflexão Bíblica

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Referências Bibliográficas
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COLLINS, Ross William. A History of Medieval Civilization in Europe. Boston: Ginn and Company, s.d.
FRANCO JÚNIOR, Hilário. A Idade média: nascimento do ocidente. 2. ed. rev. e ampl. São Paulo: Brasiliense, 2001.
GONZÁLEZ, J. L. Dicionário ilustrado dos interpretes da fé. Tradução Reginaldo Gomes de Araujo. Santo André (SP): Editora Academia Cristã Ltda., 2005.
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LATOURETTE, K. S. Uma história do cristianismo. São Paulo: Hagnos, 2007.
MATOS, Alderi Souza de. A caminhada cristã na história: A Bíblia, a igreja e a sociedade ontem e hoje.Viçosa, MG: Ultimato, 2005.
NEWMAN, Albert Henry. A Manual of Church History – ancient and medieval church history. v. 1. Philadelphia: American Baptist Publication Society, 1900.
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VEYNE, P. Quando nosso mundo se tornou cristão (312-394). Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2010.



[1] “Anão Negro" era a alcunha que seus inimigos lhe davam. E o pequeno bispo egípcio de pele escura tinha muitos inimigos. Ele foi exilado cinco vezes por quatro imperadores romanos, passando 17 dos 45 anos que serviu como bispo de Alexandria no exílio. No final, seus inimigos teológicos foram "exilados" do ensino da igreja, e são os escritos de Atanásio que moldaram o futuro da igreja.


sexta-feira, 23 de setembro de 2022

História Igreja – Personagens Influentes: Clemente de Roma

 

Clemente de Roma

            O apostolo João foi o último a falecer já próximo do final do primeiro século, encerrando o que é conhecido como o “período apostólico”. As comunidades cristãs já estavam espalhadas por todo o Império Romano, porém ainda sem a força político-social que haveria de alcançar em alguns séculos posteriores.

            Eusébio Pânfilo de Cesaréia (265-369), em sua inestimável História Eclesiástica, elaborada no início do século IV, resgata a importância desempenhada pelas lideranças eclesiásticas logo após o chamado período Apostólico, os quais passaram a ser conhecido a partir do século XVII como “Pais Apostólicos”, identificando desta forma o período histórico em que surgiram, meados do primeiro século e a primeira metade do século dois.

Alguns deles tiveram contato pessoal com algum dos apóstolos chamados pessoalmente por Cristo e/ou com alguém que os tinham conhecido pessoalmente. Desta forma, aqueles que desejam conhecer o contexto histórico imediatamente posterior à chamada Igreja Primitiva, esses são os personagens que precisam ser estudados. Poeticamente são considerados “o primeiro eco dos Apóstolos”.

Estas lideranças tiveram uma dupla responsabilidade sobre seus ombros: manter o ensino recebido na herança apostólica e o mais difícil desenvolver e consolidar a Igreja Cristã ao longo dos próximos séculos. A História vai registrar que os desafios deles foram tremendamente grandes. Entre muitos o historiador Eusébio destaca a figura de Clemente que vai exercer sua liderança eclesiástica com zelo e fidelidade (História Eclesiástica, III, 37,4-38,1).

Clemente Romano ou de Roma

             Tanto a sua origem como a sua morte está coberta por várias camadas de tradições, difíceis de serem verificadas e por esta razão difíceis de serem aceitas ou negadas em sua integralidade. O bom senso e a honestidade histórica nos recomendam muita prudência. Ainda que tais informações biográficas não deixem de conter um fundo de veracidade.

            As tradições vão desde que ele foi: um dos colaboradores de Paulo (cf. Fp 4.3) [endossada por Origines e Eusébio de Cesareia e seguido por Jerônimo]; um escravo liberto, da família romana Flávia, que posteriormente foi sagrado bispo pelas mãos de Pedro [cf. Ireneu de Lião e Tertuliano]; o autor da epístola aos Hebreus [cf. Orígenes]; um membro da família imperial dos Flávios (cf. Pseudo-Clementinas).

            O único documento informativo autenticado dele é a sua Carta dirigida aos Coríntios,[1] que comentaremos suscintamente abaixo, e mesmo que seu nome não esteja explicitado no documento, desde a Antiguidade não se coloca dúvida quanto à autoria de Clemente. Acrescenta-se ao documento o termo - Primeira - pela razão de que há uma - Segunda - carta dirigida aos Coríntios, mas que não é reconhecida como sendo de sua autoria. Reveste-se de importância histórica por ser um dos primeiros documentos cristãos a perdurar fora dos documentos canônicos preservados nas escrituras do Segundo Testamento ou Novo Testamento. Torna-se fonte primária de informações sobre a prática e o ensino da Igreja posterior à morte dos apóstolos.

            As informações biográficas de Clemente são escassas sendo uma fonte primária a oferecida por Irineu quase um século depois da morte dele, que informa que Clemente foi líder eclesiástico nos primórdios da igreja em Roma e que ele fez parte daqueles que viram “os apóstolos abençoados, e conversou com eles, e ainda tinha suas pregações soando em seus ouvidos...”; e de que “no tempo de Clemente, não pequena dissensão surgira entre os irmãos em Corinto” (LEIGH-BENNETT, 1920, c. 1).  

            Sua liderança na igreja em Roma é fixada em 92-101 dC. Com toda certeza essa comunidade cristã não decorre das atividades apostólicas de Pedro ou Paulo, mas sim do testemunho de grande número de cristãos convertidos após o Pentecostes e que tiveram que fugir de Jerusalém após a intensificação das perseguições movidas pelas lideranças judaicas do Sinédrio. O jovem fariseu Saulo de Tarso era um dos implacáveis perseguidores dos cristãos, mas veio a ser tornar Paulo, o apóstolo dos gentios e que ao redor dos anos de 60 dC, escreve uma preciosa epistola aos cristãos em Roma, expressando o desejo de conhecê-los pessoalmente e que posteriormente se tornou parte do Cânon neotestamentário.

            Exercer a liderança eclesiástica no final do primeiro século era sempre um risco de morte, pois periodicamente os imperadores romanos emitiam decretos promovendo a perseguição sobre os cristãos, inicialmente confundidos como sendo seita judaica, de maneira que seus líderes eram presos e até mesmo martirizados. Clemente exercendo a liderança na última década do primeiro século experimentou a perseguição promovida pelo imperador Domiciano (81 a 96 dC.), conforme deixa transparecer no início de sua carta aos Corintos, quando explica a demora em se comunicar com eles: “devido a infortúnios súbitos e repetidos e calamidades que nos sobrevieram…” (1 Clemente 1.1).

Carta de Clemente aos Coríntios [2]

            A epístola escrita por Clemente aos Coríntios pode ser dividida em duas partes: na primeira parte, como que preparando seus leitores para receberem a exortação corretiva, ele trata de forma comum de como todos os cristãos devem se comportar e somente a partir da segunda parte ele lida especificamente com as problemáticas cismáticas que estavam ocorrendo naquela comunidade cristã,[3] seguindo desta forma o modelo epistolar paulino.

            Outra inferência relevante para a História da Igreja é que em momento algum do documento Clemente avoca qualquer direito de liderança sobre todas as Igrejas, mas se comporta como um líder da igreja em Roma que se preocupa com a os acontecimentos lamentáveis que está a ocorrer em uma igreja irmã, revelando uma solidariedade para com a liderança estabelecida naquela comunidade. Desta forma é grave equívoco utilizar deste documento para se defender qualquer ideia de proeminência da igreja em Roma sobre as demais ou que Clemente seja um protótipo de um Papa como líder quer seja regional ou geral da igreja cristã.

            Alguns outros documentos foram atribuídos a Clemente, mas todos vieram a serem desacreditados como sendo de sua autoria. Uma segunda carta que leva o seu nome é na verdade um longo sermão anônimo e que se revela escrito em período muito posterior.

            Quanto à sua morte, as informações disponíveis não se revestem de valor histórico verificável e, portanto, confiável. O mais plausível é que tenha morrido poucos anos depois de ter escrito sua Carta aos Coríntios (AYÁN CALVO, 1994).

Epístola aos Coríntios [4]

As literaturas que haveriam de compor o futuro cânon neotestamentário já circulavam individualmente entre as comunidades cristãs e eram lidas como literatura revestida de autoridade apostólica, porém o cânon do Segundo Testamento será definitivamente concluído no quarto século.

            O período subsequente é denominado “pós-apostólico” inicia-se com o surgimento de novas lideranças eclesiásticas e alguns deles tiveram contato com João, o último dos apóstolos. As literaturas produzidas neste período são nominadas de “literatura dos pais apostólicos” e comumente incluem: a Epístola de Clemente, sete epístolas de Inácio, a Epístola de Policarpo, o material de catecúmenos Didaquê (chamado também de Ensinamento dos Apóstolos), a Epístola de Barnabé e o Pastor de Hermas. Por um curto período algumas lideranças em algumas poucas comunidades chegaram a considerar algumas dessas literaturas dos pais apostólicos no mesmo nível de autoridade que as obras dos próprios apóstolos, mas prevaleceu o consenso de não incluir nenhuma delas no cânon.

Ainda que não se encontre nenhuma referência direta da autoria da carta, há um consenso histórico de que Clemente de Roma a tenha escrito, visto que neste período exercia função eclesiástica na igreja em Roma.[5] A epístola é dirigida a igreja estabelecida em Corinto (cf. capítulo 1)[6] sendo a data provável por volta de 95 dC, conforme o abalizado trabalho efetuado pelo Dr. J. B. Lightfoot, [7] após a redescoberta do texto em sua inteireza em 1875, em que ele conclui que está data está em conformidade com o contexto histórico e hermenêutico do seu conteúdo. Esta opinião tem prevalecido como consenso acadêmico desde seu tempo.  Aceitando estes pressupostos esta epístola se constitui no primeiro documento cristão que temos pós-escritos apostólicos. Seu conteúdo é mais prático e pastoral do que teológico, ajustando-se harmoniosamente com os pressupostos anteriormente estabelecidos e preservados nos escritos apostólicos canônicos.

As igrejas ainda estavam em seus estágios iniciais e esforçando-se para manter o fio condutor em meio ao cenário complexo do Império Romano do século II. As grandes questões teológicas ainda virão e exigirão muito mais do que uma produção epistolar para trata-las. Havia, porém, muitos problemas e ameaças urgentes que precisavam ser resolvidos e que se constituem nas principais preocupações das novas lideranças eclesiásticas e Clemente juntamente com outras lideranças mantém o foco nesta problemática que ocorriam dentro das comunidades cristãs.

Como referido acima Clemente exercia a liderança eclesiástica na igreja em Roma na última década do primeiro século. Alguns advogam que ele possa ser o Clemente mencionado na epístola paulina aos Filipenses (4.3). Não é impossível, visto que sua autoridade é reconhecida entre as demais comunidades cristãs e quase nenhuma outra referência se encontra sobre ele.

Ele mantém o fio condutor no que concernem as doutrinas anteriormente definidas pelos apóstolos, que converge com as demais literaturas deste período pós-apostólicos. Por exemplo, Clemente usou a “fórmula trinitária”, pois no transcorrer da carta faz referências ao Pai, Filho e Espírito Santo como sendo igualmente Deus – embora os cristãos ainda não usassem a palavra Trindade para expressar especificamente esta doutrina. Defende em plena concordância com Paulo que a salvação é unicamente pela fé na morte de Cristo: “não somos justificados por nós mesmos, nem por nossas... obras que realizamos em santidade de coração; mas pela fé pela qual, desde o princípio, Deus Todo-Poderoso justificou a todos os homens...” (capítulo 32).

Sua atenção maior esta na crise de liderança e que acabou por produzir divisão na igreja de Corinto. Ele exorta seus leitores a buscarem a unidade em Cristo e o respeito às lideranças constituídas da igreja, pois esta unidade deve ser um reflexo da reverência à autoridade de Cristo.  Ameaças à unidade sempre foram as grandes preocupações do próprio Jesus (João 17.20-23) e dos apóstolos (Efésios 4.1-6; 1 Pedro 3.8-9). Ainda nos dias do apostolo Paulo a igreja em Corinto precisou ser severamente repreendida por suas divisões internas recorrentes (1 Coríntios 1.10ss.).

Pela leitura da carta por alguma razão, alguns membros, provavelmente uma geração mais jovem, se rebelaram contra os líderes da igreja a ponto de alguns desses líderes serem forçados a deixar suas posições, resultando em uma divisão na igreja. Alguns antecedentes do Novo Testamento em relação aos líderes da igreja seriam úteis neste momento. O Novo Testamento refere-se ao ofício principal da liderança da igreja como episkopos (cf. Filipenses 1.1; 1 Timóteo 3.1-2; Tito 1.7; 1 Pedro 2.25), que é traduzido por episcopal. O termo grego significa literalmente “supervisor”, mas em algumas versões inglesas mais antigas, como a King James Version, e em traduções dos Pais, como Clemente, é traduzida como “bispo”. Outra liderança é denominada de presbuteros (cf. Atos 14.23; Tito 1.5), traduzida por “presbítero” ou mais literalmente “ancião”, mas os termos são equivalentes não havendo grandes distinções do sentido de um supervisor. Ficando mais evidente quando ambos os termos são usados no mesmo contexto (cf. Atos 20.1, 28; Tito 1.6-7). Clemente mostrou que entendia desta mesma maneira porque utilizou tanto episkopos quanto presbuteros para essa posição de liderança da igreja (cf. capítulo 44), mantendo, portanto, o ensino recebido dos apóstolos.

O argumento para que Clemente reivindicasse a submissão às autoridades eclesiásticas constituídas foi: Deus escolheu e designou Jesus; Jesus havia escolhido e designado os apóstolos; os apóstolos escolheram e nomearam seus sucessores, anciãos-bispos/bispos (incluindo o próprio Clemente). Portanto, esse padrão deve ser mantido pelas gerações sucessivas de líderes da igreja (cf. 42). Esse conceito clementino se tornou conhecido como “sucessão apostólica”. Clemente visava manter a idoneidade das lideranças constituídas da mesma forma como Paulo fez em sua carta ao jovem pastor Timóteo (2 Timóteo 2.2) e consequentemente preservar a ordem e a unidade na igreja de Corinto e demais.

Mas este princípio acabou sendo extrapolado muito rapidamente e resultou em uma distinção entre o “clero” e o “laicato”, e a elevação do primeiro sobre o segundo. No capítulo 40, ele escreveu: “Pois os próprios serviços peculiares [do Senhor] são atribuídos ao sumo sacerdote [judeu do Antigo Testamento], e seu próprio lugar apropriado é prescrito aos sacerdotes, e suas próprias ministrações especiais passam para os levitas. O leigo está sujeito às leis que pertencem aos leigos.” Nesta última frase, ele usou a palavra grega laikos – da qual derivamos a palavra “leigo” – que pela primeira vez é utilizada na literatura cristã. O que ele obviamente está fazendo é extrair do Antigo Testamento a forma como deve ser feito serviço a Deus - por meio de um sumo sacerdote junto com muitos sacerdotes e levitas exclusivamente - e aplicá-lo à igreja do Novo Testamento. Embora não passasse pela mente de Clemente, a analogia rapidamente se desenvolveu em uma direção totalmente estranha substituindo a figura dos bispos cristãos pela figura dos “sacerdotes”, de modo que somente eles estavam qualificados para fazer o ministério de Jesus Cristo. Que vai abrir o caminho para que como sacerdotes se tornassem mediadores entre os leigos e Deus, e posteriormente se introduzisse a figura do Papa, o que é completamente destoante do ensino claro das literaturas neotestamentária e do ensino enfático do apostolo Paulo de que não há outro mediador entre Deus e os homens, a não ser Jesus Cristo.

Clemente também conclamou os dissidentes a se arrependerem e se submeterem as autoridades constituídas (cf. 57; Hebreus 13.17). A preocupação principal de Clemente refletia a preocupação muito clara de outros escritores neotestamentário – a preservação da unidade da igreja. Ele também entendeu, acompanhando os ensinos apostólicos, a importância da liderança da igreja local (presbíteros e diáconos) para preservar a verdade bíblica e a unidade bíblica, o que ainda hoje são relevantes para as igrejas locais. Por outro lado, Clemente ilustra o perigo de se transformar algo que foi escrito e deturpá-lo do que foi originalmente pretendido. Infelizmente isso será recorrente no fluxo da história da igreja, como se pode ver nas páginas da História da Igreja Cristã.


Utilização livre desde que citando a fonte
Guedes, Ivan Pereira
Mestre em Ciências da Religião.
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Referências Bibliográficas

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COMPENHAUSEN, Hans von. Os pais da Igreja: A vida e a doutrina dos primeiros teólogos cristãos. Rio de Janeiro: CPAD, 2005.

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TROCMÉ, Etienne. L’enfance du christianisme. Hachette littérature, coll. Pluriel, 1999.



[1] O acesso ao texto desta carta vem através do Codex Alexandrinus: manuscrito da Bíblia grega, presente do patriarca Cirilo Lucaris ao rei Carlos I da Inglaterra em 1628. Entretanto, faltavam folhas correspondentes aos capítulos LVII, 6 e LXIV,1. Mas outra fonte descoberta, o Hierosolymitanus, permitiu suprir as lacunas do Alexandrinus. A versão latina integral foi publicada em 1894.

[2] O título, “A Primeira Carta de Clemente aos Coríntios”, usada em todos os manuscritos existentes da epístola é para distingui-las de outras cartas não autenticadas que surgiram em data muito posterior.

[3] Algumas edições deste documento de Clemente destacam estas duas sessões.

[4] O texto atual, depois de perdido na Idade Média, foi redescoberto com o Codex Alexandrinus, enviado como presente de Ano Novo pelo Patriarca grego de Constantinopla, Cirilo Lucar, ao rei inglês Carlos I, em 1627. The Royal Librarian, Patrick Young, editou e publicou as duas epístolas Clementinas contidas no códice, com notação de capítulo moderna, em 1633 (HERRON, 1988, P. 23).

[5] Dois testemunhos históricos corroboram essa conclusão: Hegesipo, de origem judaica, no registro de suas memórias (155-166) cita a Carta de Clemente dirigida aos Coríntios; Dionísio, o bispo de Corinto, em uma correspondência (ano 170) menciona que esta autenticação vinha de muito tempo e que era lida nas assembleias (cultos) normalmente.

[6] A epistola foi dividida, muito tempo depois, em curtos 65 capítulos.

[7] Lightfoot faz uma extensa análise e esforço para identificar o Clemente histórico, pp. 14-103.

quinta-feira, 25 de agosto de 2022

Síntese da História da Igreja Cristã - 4º Século

Cada instante é único. Mas há momentos que se tornam decisivos.

O Cristianismo que até o terceiro século foi perseguido, primeiramente pelo judaísmo e posteriormente pelo Império Romano, experimenta no quarto século uma total inversão desta situação: as religiões classificadas como pagãs foram proibidas e seus adeptos passaram a ser perseguidos e a religião cristã vai assumindo cada vez mais a primazia dentro da política do Império Romano. Constantino torna-se o primeiro Imperador romano a assumir esta nova religião.           

Com a inserção do Imperador Constantino na estrutura eclesiástica da Igreja Cristã, ele convoca o primeiro grande Concílio, até aqui os Concílios eram regionais, e diante dos impasses acaba determinando o resultado de discussões teológicas que não encontravam consenso entre as lideranças cristãs. No final do século IV, o cristianismo em sua forma católica (universal) sera decretada como a religião do Império pelo imperador Teodósio em 380. Um pouco antes, em 356, Constâncio, um dos filhos de Constantino, havia baixado leis que ameaçavam com a pena de morte aqueles que promovessem sacrifícios ou culto à ídolos. 

Evidente que não foi uma inversão tranquila, pois ainda houve esforços para manter o Cristianismo em subserviência. O Imperador Diocleciano, nos primeiros anos do século tentou erradicar a religião cristã e determinando que os cristãos fizessem oferendas aos deuses e participassem de cultos pagãos. Uma das últimas reações oficiais contra o Cristianismo foi promovida pelo Imperador Juliano que tentou reviver o paganismo durante seu curto reinado (361-363). Após sua morte, seus sucessores não apenas assumiram o Cristianismo como religiões oficiais como passaram a dificultar a vida das outras religiões dentro do Império.

As lideranças cristãs vão assumindo cada vez mais a influência sobre as diretrizes políticas do Império e começam a perseguir os que antes lhes perseguiam com a chancela das autoridades imperiais. Em 385, um bispo e alguns de seus liderados foram condenados à morte porque ensinavam princípios doutrinários que divergiam da chamada ortodoxia da igreja oficial e/ou predominante, que viria a se constituir a Igreja Católica Romana. Os templos das religiões consideram pagãs são adaptados para serem templos cristãos, ou são simplesmente destruídos, assim como os chamados bosques sagrados, locais onde se praticavam ritos religiosos. Toda literatura pagã ou contraria aos dogmas conciliares começam a serem anatematizadas e destruídas. 

Então o Imperador Teodósio deu o golpe final em 392, proibindo toda e qualquer manifestação cúltica fora dos padrões agora estabelecidos pela Igreja Cristã oficial. Desta forma, o caminho está completamente desimpedido para que a religião cristã se expandisse mais rapidamente por todo o Império, bem como sua influência na máquina pública governamental, assumindo cada vez mais o poder nas instâncias do judiciário. 

No quarto século a figura do Imperador Constantino tornou-se reverenciado por todo o Cristianismo oficial, visto que dele veio o primeiro reconhecimento imperial da religião cristã e os benefícios crescentes que vão se sucedendo, de maneira que, a vida e o governo de Constantino vão se amalgamando com o estabelecimento da religião cristã. O próprio imperador admite uma experiência sobrenatural cristã em 312. Em momento anterior, em abril de 311, quando ainda reinava apenas sobre a Espanha, a Gália e a Bretanha, ele havia estabelecido um consenso muito relevante com os outros três imperadores que naquele momento simultaneamente compartilhavam o Império[1], um decreto concedendo aos cristãos a liberdade de culto e a restituição dos direitos eclesiásticos propriedade, que lhes haviam sido tirados por decretos imperiais anteriores.

Este edito marca oficialmente o fim da perseguição contra os cristãos no Oriente, cujos imperadores Galério e Maximino Daia haviam mantido com determinação, mesmo após a renúncia de Diocleciano em 305, onde muitas lideranças cristãs pereceram em martírios. Diferentemente do que vai ocorrer no Ocidente onde a perseguição oficial se extinguiu com bastante rapidez por volta de 306. Houve uma resistência ao edito mencionado acima, em que Maxêncio, um dos quatro imperadores, recusou-se a aplicar este edito. Foi a oportunidade para que Constantino ampliasse seus territórios, esmagando os exércitos de Maxêncio nas proximidades de Roma em outubro de 312, durante a Batalha da Ponte Mílvia ou Batalha da Ponte Mílvio, tornando-se imperador de seus territórios na Itália e no norte da África.

Em 313 em Milão, Constantino encontra-se com Licínio, que compartilhava seu poder no Oriente com Maximino Daia. Os dois homens definem ali os princípios religiosos que devem ser aplicados no Império: liberdade de culto para todos os cidadãos, restituição dos bens confiscados com os cristãos. Maximino Daia resiste em implementar os termos do decreto que é chamado de Edito de Milão. Em nova batalha e sendo derrotado por Licínio o imperador Daia prefere escolher a saída pelo suicídio. Mas as diferenças entre os dois imperadores vão aumentando e em 324 ocorre nova batalha, tendo como um dos pontos conflitantes a hostilidade de Licínio contra o cristianismo, de maneira que agora Constantino unifica o trono do Império Romano.

Com a consolidação do poder soberano de Constantino, Igreja e Estado tornam-se umbilicalmente interligados. O imperador vai assumindo cada vez mais prerrogativas eclesiásticas e será denominado de o "bispo de fora",[2] sendo responsável pela gestão dos assuntos externos da Igreja, entretanto, ingere cada vez mais nos assuntos internos da Igreja. Os primeiros Concílios cristãos carregam a sua marca pessoal, influenciando os debates teológicos, que se intensificaram neste século IV. Um destes debates vai perdurar por mais de meio século: a questão da Trindade.

Por volta do ano 318, o Oriente foi incendiado pelas doutrinas de um bispo chamado Ário (em latim: Arius) ou Areio (em latim: Areius), sacerdote de um dos grandes centros cristãos em Alexandria, que deu origem ao movimento denominado arianismo[3]. A tese de Ário visava preservar a posição preeminente do Pai na trindade, à qual ninguém, nem mesmo o Filho, pode ser comparado. Segundo ele somente o Pai existe desde toda a eternidade e o Filho foi criado do nada por Ele, de maneira que o Filho não compartilha da mesma natureza do Pai[4] – está pronto o barril de pólvora e bastará uma pequena faísca para que ele exploda o que vai ocorre em muito breve.

Em resposta aos ensinos classificados como herético, Alexandre então bispo de Alexandria, excomunga Ário e todos seus seguidores. O ensino, que será posteriormente tornado oficial como parte integrante da ortodoxia da Igreja Cristã, definira que o Verbo (o Filho) coexiste com o Pai desde toda a eternidade, portanto, ele não foi criado, e a natureza do Filho é a mesma do Pai. 

Por sua vez Ário não aceita a decisão de seu bispo e inicia um movimento de resistência buscando apoio entre as demais lideranças da Igreja, encontrando forte apoio no Oriente. O Imperador Constantino receoso de que este embate teológico viesse a dividir a Igreja Cristã e afetar a própria estabilidade do Império, decide intervir para pôr fim a este conflito. Ele convoca um Concílio geral (325 d.C.) para se reunir em Nicéia (agora Izbik na Turquia). É o primeiro de seu tipo, pois até então, os concílios não tinham ido além do nível regional.

Após inúmeros embates teológicos as teses de Ário são condenadas e a cristologia ortodoxa é definida em uma Confissão de Fé, também chamada de símbolo ou credo: Jesus Cristo é “Deus de Deus, luz de luz, verdadeiro Deus de verdadeiro Deus”. A pitada de Constantino vem através de seu conselheiro eclesiástico Ósio de Córdoba[5], que acrescentou uma pequena frase “consubstancial ao Pai”, enfatizando que o Filho é perfeitamente igual ao Pai.

Entretanto esta palavra, "consubstancial" (homoousios[6] em grego), não demorou muito para desencadear imediatamente uma disputa teológica que não terminaria até o Concílio de Constantinopla em 381. Os bispos orientais que haviam apoiado Ário, diante da forte pressão imperial, começam a se retratar e adotar a posição oficial Concílio. Constantino não hesita em excomungar os recalcitrantes, que veem perigo na utilização do termo "consubstancial", pois temem o ressurgimento de uma antiga heresia, ensinada por um bispo chamado Sabélio[7], que mal distinguia Cristo do Pai.

Mas três anos após o Concílio de Nicéia, o próprio Constantino deu uma nova guinada e reabilita o arianismo. Seus sucessores se alinham a essa posição, para tentarem impedir o crescente poder eclesiástico cristão nas entranhas do Império, ainda que com algumas nuances. A exceção é Imperador Juliano, mais tarde chamado de Apóstata, que tenta resgatar as religiões familiares romanas e Valentiniano (364-375), que se torna fiel à fé nicena. Em 381, o imperador Teodósio coloca fim às intrigas e reafirma definitivamente os conceitos teológicos estabelecidos no Concilio de Nicéia. Hoje, esse Credo, com pequenas diferenças, ainda é compartilhado pelas denominações cristãs mais ortodoxas.

Mas o que parecia ser um momento de pacificação e prosperidade da Igreja Cristã, vai se constituir no inicio de diversos movimentos intestinos. Na mesma proporção que a Igreja torna-se cada vez mais poderosa e rica, ocorre um relaxamento do fervor cristão, pois ela vai se amalgamando com o secularismo e materialismo. Por não aceitarem esta acomodação e por não terem forças para lutarem contra, inicia-se um êxodo cristão para fora da Igreja Oficial. Um dos caminhos é o silêncio do deserto, a solidão e a meditação pessoal. 

Este século IV, decisivo em mais de um sentido para a história do cristianismo, viu também o nascimento do monaquismo[8] ou monasticismo que teve seus precursores ainda no século III, sendo o mais ilustre Antão,[9] que foi um jovem egípcio nascido em 251 (ele morrerá com mais de cem anos em 356); insatisfeito decide um dia deixar tudo, família, trabalho e bens materiais para se isolar no deserto, tornando-se o precursor dos chamados anacoretas,[10] aqueles cristãos que escolhem levar uma vida solitária. Estes eremitas serão os protótipos do monasticismo cristão.

Mas Pacômio (c. 292-348), também conhecido como Abba [Pai] Pacômio, vai iniciar outro movimento de vida comunitária, o cenobitismo (koinobion "vida em comum"), caracterizado por disciplina estrita, adoração regular e trabalho manual. Em 326 ele inicia a primeira comunidade de monges no Alto Egito, com as características acima mencionadas. Esse modelo de comunidade religiosa começa a se espalhar no Ocidente e Jerônimo (347-419), que havia sido monge no Oriente, propõe esse modelo comunitário em Roma e Agostinho e Eusébio dão impulso aos mosteiros episcopais.

No final do século IV a Igreja parece ter alcançado seu ápice: politicamente, não têm mais adversários e sua expansão ultrapassa as fronteiras do Império; intelectualmente brilha graças aos chamados Padres da Igreja, esses bispos-escritores irão deixar uma rica herança composta de sermões, histórias, comentários e tratados teológicos; culturalmente, desenvolve-se a chamada arte cristã que vai perdurar por toda a Idade Média; socialmente, o cristianismo penetrou em todos os estratos sociais, dos camponeses aos aristocratas; economicamente, as igrejas adquirem e acumulam consideráveis ​​riquezas e territórios.

Mas as nuvens escuras estão se formando rapidamente, prenunciando grandes tempestades para o próximo século. O Império está muito doente, e os bárbaros logo invadirão suas terras. Assim como os mandatários imperiais, as lideranças cristãs eclesiásticas se sentem completamente seguros entrincheirados nas entranhas do Império, mas essa falsa sensação de segurança vai exigir um alto preço.

Datas importantes

301

A Armênia é o primeiro país do mundo a adotar o cristianismo como religião do Estado

303

Imperador Diocleciano lança perseguição para erradicar o cristianismo; queima de muitas escrituras e milhares de mortos.

305

Abdicação de Diocleciano; nova tetrarquia.

306

Constantino se torna imperador

311

Início da grande polêmica se os que renunciaram a fé cristã, durante a perseguição deveriam retornar à comunhão ou serem rebatizados; Agostinho entende que sim e os donatistas como Petiliano entende que não.

312

Constantino adota o cristianismo, após ter uma visão de uma cruz e de que venceria a batalha derradeira na ponte Mílvia; ele de fato venceu a grande batalha.

313

O imperador Constantino promulga o édito de tolerância de Milão, redigido por Galério, pelo qual legaliza o cristianismo como religião tolerada pelo Império, dez anos após a “Grande Perseguição”; começa a ascensão da igreja cristã.

320

Ário de Alexandria começa a ensinar que Jesus era um ser criado e não Deus por natureza, seus conceitos teológicos são conhecidos como “arianismo”.

Pacômio estabelece um importante mosteiro na região de Tebaida, Egito e logo proliferam outros, incluindo um para mulheres.

324

Eusébio de Cesareia escreve sua obra “História da Igreja” importante para se compreender o desenvolvimento eclesiástico da Igreja Primitiva. Também faz referência a autoria dos escritos evangélicos neotestamentários.

325

Concílio de Niceia foi o primeiro grande Concílio e fundamental para a Igreja Cristã; condena o arianismo e reafirma a doutrina da cristologia da “mesma substância do Pai”, estabelecendo a máxima de que Jesus é plenamente Deus e não criado.

329

Surge os chamados Padres Capadócios: Basílio de Cesareia; Gregório de Nazianzo; Gregório de Nissa. Defendem magistralmente a doutrina da Trindade.

330

Fundação de Constantinopla a nova capital do Império e que se tornara o pivô da Grande Cisão do cristianismo – Oriente e Ocidente.  

337

Morte de Constantino. Somente em seus últimos dias foi que ele se submete ao batismo cristão via a vertente dissidente do arianismo, que foi reiteradamente condenada desde Nicéia.

347

Jerônimo que veio a ser o tradutor da Vulgata latina (404) que se tornaria a única versão da Bíblia autorizada pela Igreja Romana no primeiro milênio. Inicialmente rejeita os chamados livros apócrifos, mas próximo da morte foi pressionado a inclui-los.

350

Teodoro de Mopsuéstia defende as duas naturezas divina/humana de Jesus. Perfeitamente Deus e Perfeitamente Humana. Se opondo ao Nestorianismo que afirmava que Jesus era duas pessoas distintas.

354

Agostinho de Hipona uma das mentes mais brilhantes do cristianismo. Desenvolveu os estudos das doutrinas da graça (abundantemente utilizada pelos Reformadores sec. XVI), da igreja e os sacramentos e a da Trindade. Seu conceito bíblico da depravação total pós queda e de que o ser humano já nasce pecador, contrapondo o ensino de Ireneu de que o ser humano nasce bom e torna-se pecador por um ato da vontade (controvérsia do livre arbítrio que ainda hoje é debatido); desenvolveu a visão linear da História que era até então cíclica. Para Agostinho a História caminha para uma conclusão (fim).

375

Início da polêmica Pelagiana em que Pelágio defende que o ser humano, mesmo depois da queda, pode melhorar até o aperfeiçoamento por si mesmo. Agostinho contrapõe afirmando que sem a graça de Deus o ser humano jamais voltara ao seu estado original de pureza (obras x graça). No Concílio de Cartago o pelagianismo foi rejeitado e o ensino de Agostinho foi endossado oficialmente.

378

Cirilo de Alexandria o grande defensor do ensino bíblico das duas naturezas de Cristo em oposição a Nestório. A questão foi exaustivamente debatida no Concílio de Éfeso, onde seu ensino foi aceito e o de Nestório foi rejeitado.

380

O cristianismo em sua forma católica é proclamado a religião do Estado

381

Concílio de Constantinopla produz um Credo onde se reafirmam a Ortodoxia Nicena e a subsequente condenação definitiva do arianismo e do modalismo.

390

O cristianismo chega na Irlanda através de Magonus Sucatus Patricius ou Patrick.

391

Édito de Teodósio estabelece oficialmente o cristianismo como a religião do Império Romano e proibindo completamente quaisquer outras manifestações cúltica.

 Utilização livre desde que citando a fonte
Guedes, Ivan Pereira
Mestre em Ciências da Religião.
Universidade Presbiteriana Mackenzie
me.ivanguedes@gmail.com
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[1] Esse sistema de governo chamado de Tetrarquia foi implementado por Diocleciano, em decorrência da grave crise que se havia instalado no Império no final do século III e que se inicia em 293 e perdura até 313. A Tetrarquia era composta por dois imperadores augustos (supremos) e dois imperadores césares! Inicialmente Constantino foi aclamado césares pelas tropas na Grã-Bretanha, ficando subordinado a Severo o Augusto.

[2] Na esteira do Concílio de Niceia, Constantino, embora não submisso ao batismo, portanto pagão, recebeu dos bispos cristãos o título de “episcopus ad extra” (o bispo de fora) e doravante será ele quem julgará os bispos; convocará e presidirá concílios e resolverá questões religiosas.

[3] O arianismo foi a interpretação cristológica antitrinitária sustentada pelos seguidores de Ário.

[4] Certamente a fonte primária do conceito ensinado até hoje pelos chamados Testemunhas de Jeová.

[5] Ele foi o principal defensor ocidental da ortodoxia na luta inicial contra o arianismo; ele nasceu por volta de 256 e morreu por volta de 358 em Sirmium ou na Espanha. Nos primórdios do conflito arianista (donatista), em que se manifestará a preocupação de Constantino pela manutenção da unidade eclesiástica, que pela primeira vez Ósio aparece mencionado em documentos oficiais associados ao imperador.

[6] Homoousios significa "uma substância" ou ainda da "mesma substância". Se o Filho teve um começo, como Ario estava afirmando, então o Filho foi feito de matéria, uma vez que a substância de Deus não pode ter começo. Entretanto, se Cristo é da mesma substância de Deus, então ele sempre existiu. Está foi a conclusão final do Concílio e passou a fazer parte integrante da chamada ortodoxia teológica cristã.

[7] Os conceitos teológicos de Sabélio são denominados de sabelianismo e a doutrina fundamental desenvolvida por ele é conhecida como Unicidade de Deus ou como alguns preferem Modalismo, isso decorre do fato que para ele Deus é uma Única Pessoa (ser) e que se manifesta de diversas formas, portanto, ele rejeitava a doutrina da Trindade (Pai, Filho e Espírito Santo). Sabélio defendia um monoteísmo absoluto.

[8] A palavra monaquismo vem do grego “moncos” (= aquele que está só); significa uma forma de vida cristã totalmente consagrada a Deus no retiro, no silêncio, na oração, na penitência e no trabalho. Vai dar origem aos Monastérios e Conventos que se multiplicaram no período a Idade Média.

[9] Antão, também conhecido como Antão do Egito, Antão, o Grande, Antão, o Eremita, Antão, o Anacoreta, ou ainda O Pai de Todos os Monges.

[10] Os anacoretas (anachōrētḗs), "aquele que abdicou do mundo”, "retirou-se", "recolheu-se" eram ermitãos cristãos que viviam em retiro e solidão, especialmente nos primórdios do cristianismo, dedicando-se à oração e à escrita de liturgias, a fim de alcançar um estado de graça e pureza de alma pela contemplação.