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quarta-feira, 26 de julho de 2017

Antes da Reforma Protestante – Corrupção e Desvios Teológicos


            Este é o ano em que se comemoram os 500 anos da Reforma Protestante ocorrido hoje no longínquo século XVI. E de fato poucos movimentos religiosos cristão tiveram tamanha relevância e repercussão como este. A história desta Reforma não se relaciona apenas com a Igreja Cristã, mas implica em toda Sociedade, não apenas daqueles dias, mas ainda hoje se faz sentir seus efeitos.
            Mas como todo e qualquer evento histórico eles são decorrentes de eventos anteriores. Nesse e alguns outros artigos vamos resgatar esse contexto histórico-religioso que certamente proporcionaram um melhor entendimento das razões que culminaram com a Reforma Protestante que tão rapidamente se espalhou por toda Europa e demais países adjacentes e abalando os poderes da Igreja Católica Romana e do próprio Império que lhe dava sustentação.
            Temos plena consciência de que a Reforma Protestante esta interligada a toda sorte de áreas e setores que compõe a Sociedade como a politica (nacionalismo), a economia (novos mercados/Índia, África e América), as artes e letras (renascentismo e humanismo) e as mudanças de classes sociais (ascensão burguesa) que estão ocorrendo conjuntamente às questões religiosas. Todavia, como a Reforma ocorre primariamente dentro da Igreja Cristã (Romana) é necessário entendermos o que estava acontecendo e quais foram os motivos teológico-religiosos que impulsionaram esse movimento tão viral e abrangente em suas ações e realizações que afetaram e ainda afetam todo cristianismo mundial.
A Penitência e a Absolvição nas mãos do Clero
            Os cristãos dos primeiros séculos receberam uma mensagem muito simples e direta, utilizando as palavras do apóstolo Paulo ao carcereiro da cidade de Felipos que estava prestes a tirar sua própria vida e que interrompido pelo apóstolo volta-se para ele e pergunta: o que preciso fazer para ser salvo? E Paulo não tem nenhuma dúvida ao responder: creia no Senhor Jesus e será salvo! Mas com o passar dos séculos tudo isso se modificou e a salvação passou a ser um processo longo, árduo e muito caro.
            Se antes a salvação era uma questão direta do pecador arrependido com Jesus Cristo, agora antes de chegar a Jesus esse peregrino terá que enfrentar a cara burocracia eclesiástica que foi desenvolvida nos antros da eclesiologia católica romana. Agora já não era suficiente a simplicidade da fé em Jesus para garantir a salvação, é preciso somar a essa fé as boas obras meritórias e a plena submissão às autoridades eclesiásticas, cujo caráter era muito mais do que apenas duvidoso, uma vez que estas autoridades eram nomeadas pelo critério geopolítico e econômico, em detrimento das qualificações espirituais e religiosas. Evidentemente que a salvação pela fé foi mantida nos dogmas eclesiásticos a custo de muitos e intensos e até sanguinários Concílios, todavia, na prática se construiu um sistema de perdão de pecados cujo percurso era ampliado na mesma proporção em que aumentava os interesses inescrupulosos dos detentores do poder eclesiástico romano.
            Ainda no Concílio de Trento (325) a penitência foi classificada como sendo a segunda tábua sobre a qual o náufrago (pecador) encontra salvação, assim como o batismo é a primeira tábua. Ainda nesse Concílio o sacerdote católico romano passou a ser considerado indispensável na intermediação entre o pecador e Deus, estando revestido do poder de pronunciar a absolvição.
            Avançando a ampulheta do tempo, no raiar do século XII a singela fé do carcereiro de Filipos não lhe daria mais do que uma senha na fila das inumeráveis penitências que deveria realizar antes de adquirir o perdão de seus pecados: deve andar descalço, utilizar trapos em vez de roupas normais, deixar sua casa e sua terra natal e peregrinar por terras distantes, renunciar ao mundo e abraçar a vida monástica. Um pouco antes, no século XI havia se tornado uma prática corriqueira os açoites voluntários (autoflagelo), e na Itália pessoas de toda sorte de classes sociais, homens e mulheres, velhos e crianças fazem procissões às centenas e até milhares, entrando nas vilas e cidades, cobertos apenas por uma túnica, em pleno inverno europeu. Nas ruas ouvem-se os gritos e gemidos pelos açoites auto infligido.
Nascem as Indulgências
            Diante de tanto sofrimento e miséria cria-se um caminho alternativo menos dolorido e mais cômodo – nasce a famigerada indulgência (“indulgência”, tirada do  latim,  significa  perdão  ou  quitação  de  uma  dívida).  O criador desta proposta coube a João Faster, Arcebispo de Constantinopla, coincidentemente a capital do Império. Seu discurso alcança os ouvidos dos milhares que transitam pelos descaminhos da autoflagelação e da desesperança – nós (clérigos) haveremos de fazer as penitencias por vocês de maneira que vocês não precisaram carregar mais seus fardos insuportáveis – mediante uma pequena contribuição de quem pode, mais e de quem não pode, menos. Vozes corajosas se levantaram contra essa aberração mercantilista, mas foram caladas e sufocadas.
            Logo os papas de plantão descobriram os benefícios próprios advindos da demanda dessas indulgências. Para encher os cofres insaciáveis de uma Igreja crescentemente opulenta nada melhor do que um recurso fácil sob o disfarce de uma contribuição voluntária (qualquer semelhança com o evangelicalismo brasileiro atual não é mera coincidência). É preciso fundamentar e torna-la indispensável para que os recursos possam fluir continua e abundantemente. Os teólogos de plantão trabalham arduamente nesse embasamento e Alexandre de Hales[1] (Doctor Irrefragabilis e Theologorum Monarcha) e St. Cher no século XIV produz uma fundamentação para doutrina da indulgência. Para eles as obras e as ações dos santos (lideres cristãos que morreram em martírio) e mesmo de Cristo deixaram um apreciável tesouro de bons atos não usados inteiramente por eles. Havia, pois, um saldo de santidade que teria formado um capital celestial, um tesouro dos méritos que estaria disponível aos interesses do Santo Papa. Como único detentor da chave, o papa podia recorrer ao Tesouro dos Santos armazenado no céu para poder distribuir o seu conteúdo entre os crentes.
            Uma bula papal emitida por Clemente VII declara as indulgências um artigo de fé. Para ele o sacrifício de Cristo e os sacrifícios dos mártires deram à Igreja um tesouro que perdura à própria eternidade. A custódia e administração desse tesouro foram confiadas ao Vigário de Cristo na terra, ou seja, ele mesmo e seus sucessores papais. Quem naquela época ousaria atacar uma origem tão sagrada? John Wyclif, classificado entre os denominados pré-reformadores, que estava alcançando a maturidade quando Clemente assumiu a cadeira papal, pregou e escreveu “da indulgente fantasia do tesouro espiritual do céu, de que cada papa se torna despenseiro absoluto, coisa sonhada e sem fundamento”.
            Mas a indústria das indulgências evolui rapidamente. Surgem sempre novas indulgências para cada ocasião. Dependendo do pecado oferecem-se indulgências para longo prazo que podem chegar a dez, vinte e até mais de cem anos. E o que parecia ser um caminho mais suave vai se tornando um caminho cada vez mais ardiloso e nefasto para o pobre (ou rico) pecador.
Purgatório
            Mas como cobrar uma divida de longo prazo se a vida é tão breve (as pestes e toda sorte de malefícios tornava a vida humana limitada). Chegando a morte o pecador ficará livre de sua dívida e entrara feliz na eternidade? Claro que não! Enquanto o pecador estiver em débito com a Igreja ele está impossibilitado de entrar no céu. Mas onde ele vai ficar após a morte na terra? No Purgatório é claro!
Antes mesmo de Agostinho, século IV, houve diversos teólogos que mencionavam um estado intermediário entre o céu e o inferno, onde as almas poderiam ser purificadas para adentrarem permanentemente no céu.[2] Mas até Agostinho era tratado ou compreendido como um processo de salvação espiritual, sem ingerência da Igreja. Mas agora, nos séculos XII e XIII a ideia de que o purgatório é um “lugar à parte” toma forma.
No século XIII o Purgatório triunfou na teologia e no plano dogmático. A sua existência é certa, tornou-se uma verdade de fé da Igreja. Sob uma forma ou sob outra, num sentido muito concreto ou mais ou menos abstrato, é um lugar. Oficializa-se a sua formulação. Em dar sentido pleno a uma prática cristã muito antiga: os sufrágios pelos mortos. (LE GOFF, 1995, p.345).
O Papa encontra no Purgatório a resposta para a questão da indulgência não recebida. Enquanto no Purgatório o pecador poderia mediante as indulgências alcançar o crédito necessário para ter seus pecados perdoados e finalmente descansar na glória celestial. Apavorados cotidianamente pelos pregadores de plantão a população torna-se refém dos tormentos futuros. Algumas pinturas daquele período revelam os horrores com os quais os fieis eram aterrorizados pela Igreja e seus clérigos terroristas. Quem permitiria que seus entes queridos pudessem sofrer tamanho sofrimento e ainda correr o risco de ser lançado no inferno? As moedas enchiam os gazofilácios eclesiásticos que remetidos a Roma erigiam Catedrais, financiavam toda sorte de luxo e riqueza aos seus bispos e sustentavam seus exércitos e todo esse dinheiro era compartilhado com os reis e imperadores de ocasião.
Com João XXII surgem as chamadas indulgências fiscais onde os pecados mais degradantes são catalogados e lhes conferido valores de indulgências: incesto, assassinato, infanticídio, adultério, perjúrio, roubo – cada pecado com seu devido valor correspondente.
O papa Bonifácio VIII, o mais ousado e ambicioso depois de Gregório VII, foi mais criativo que seus antecessores. Ele publicou, em 1300, uma bula papal pela qual ele anunciava que nos próximos cem anos, todos aqueles que visitassem (fizessem peregrinação) a cidade de Roma, obteriam uma indulgência plenária. O sucesso foi imediato e multidões advindas de todas as adjacências da Itália, França, Espanha, Alemanha, Hungria e de todos os demais lugares onde a igreja se fazia presente invadiram a cidade romana – em um único mês contam-se duzentos mil peregrinos. Todos esses peregrinos traziam suas ofertas e o Papa e sua opulenta máquina eclesiástica viram seus tesouros se encherem a transbordar. Mas a ganância humana não tem limites e logo se diminuiu o tempo para cada jubileu de cinquenta, depois de trinta e três, e, finalmente, a vinte e cinco anos.
Mas é preciso destacar que muitos continuaram a honrar a Igreja da idade média. Por causa desses homens e mulheres que se mantiveram aguerridos aos princípios basilares do cristianismo a Igreja permaneceu sendo Igreja, apesar de todas as aberrações e desvios de suas lideranças eclesiásticas. A Igreja cristã continuou sendo o lugar de acolhimento para os desvalidos e abençoador para os publicanos e pecadores que careciam do perdão de seus pecados. Grandes servos de Jesus Cristo resplandeceram como luzeiros no meio das intensas trevas que os circundavam e sal de uma sociedade permanentemente depravada (alguma diferença dos dias atuais?). Nas vilas mais obscuras, nos conventos e mosteiros encontram-se aqueles que anseiam por uma Igreja livre e bíblica. Nas ainda incipientes universidades as penas, tinta e papel começam a produzir uma crescente onda de protestos cada vez mais veementes.
Ainda que se possa confundir o papado com a Igreja, são coisas distintas assim como a água e o óleo que se não misturam. Os desmandos e corrupção dos clérigos romanos não podem ser confundidos com a vivacidade da Igreja Cristã que permaneceu e permanece ainda hoje, apesar de todas as formas de deturpações produzidas pelas ortodoxias humanas.  A Reforma do século XVI visava os desmandos eclesiásticos, mas acabou atingindo a própria Igreja que haverá de se fragmentar ao longo dos séculos posteriores. E se faz justo dizer que apesar dos desmandos papais, muito dentre esses foram instrumentos da providência divina para preservação da Igreja mediante o poder e ambição dos reis e imperadores que tentaram destruí-la ou dominá-la ao longo da história.

Utilização livre desde que citando a fonte
Guedes, Ivan Pereira
Mestre em Ciências da Religião.
Universidade Presbiteriana Mackenzie
Outro Blog
Reflexão Bíblica


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Referências Bibliográficas
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________________. A bolsa e a vida: economia e religião na Idade Média. São Paulo: Brasiliense, 2004.
LOHSE, Bernhard. A fé cristã através dos tempos. Trad. de Sílvio Schneider, rev. de Fausto de Borba Borges. 2. ed. São Leopoldo: Sinodal, 1981.  
MATOS, Alderi Souza de. A caminhada cristã na história – a Bíblia, a igreja e a sociedade ontem e hoje. Viçosa, MG: Ultimato, 2005.
TILLICH, Paul. História do pensamento cristão. Trad. de Jaci C. Maraschin. São Paulo: ASTE, 1988.
THE ENCYCLOPEDIA of Christianity. Grand Rapids: Eerdmans, 1999.




[1] Foi um filósofo e teólogo inglês, notável pensador na história da escolástica e da Escola franciscana.
[2] Desde os grandes Padres da Igreja do século IV, Ambrósio, Jerônimo e Agostinho – fazem menção que as almas de certos pecadores poderiam talvez vir a ser salva durante um determinado período de provação (LE GOFF, 1995,p.17).

quarta-feira, 12 de julho de 2017

Quadro Sintético dos Sete Concílios Cristão Ecumênicos

Introdução
            A história dos concílios, ou sínodos eclesiásticos é uma área do conhecimento pouco explorado pelos evangélicos de forma geral, mesmo se tratando das chamadas denominações históricas. Neste mundo evangélico-protestante a impressão é que a história e a própria teologia surgiram apenas após a denominada Reforma Protestante ocorrida no século XVI. Ao jogar quinze séculos de história e teologia fora se corre o velho risco de jogar a água e a criança juntas. Desde os dias dos apóstolos (Atos) até o século XVI (Reforma) a Igreja Cristã construiu todos os seus fundamentos e na verdade o que os reformadores desejavam unanimemente era resgatar as verdades bíblico-teológica-eclesiástica que haviam sido amalgamadas com toda sorte de erros, desvios e equívocos muitas vezes por razões às mais espúrias imagináveis. Por está razão o movimento foi denominado Reforma e a ruptura com a Igreja Católica Romana ocorre pela razão de não haver possibilidade de se realizar as mudanças necessárias.
            Assim sendo, não se deve desprezar os quinze séculos iniciais do cristianismo, mas ao contrário, temos o dever de estuda-los com afinco e acuidade e extrairmos tudo quanto de bom e coerência bíblica. Esses séculos se constituem em um enorme e caudaloso rio com suas tranquilas, suas corredeiras turbulentas e perigosas, suas cachoeiras magnificas e que precisa ser navegado continuamente para se explorar todas as suas riquezas.
Uma parte importante desta vasta historiologia são os chamados Concílios Ecumênicos ou Sínodos Eclesiásticos.  Ainda que Lucas registre a realização de um Concílio em Jerusalém (Atos 15), para se discutir a questões da entrada dos gentios na Igreja, cujas teses de Paulo e Barnabé prevaleceram sobre as teses do grupo denominado judaizantes e posteriormente Tertuliano mencionem algo semelhante para discutir a permanência ou não do escrito “Pastor de Hermas” no cânon das Escrituras cristãs, no século III (HESS, 2002, p. 15), o primeiro nos moldes mais modernos do termo e dos quais suas resoluções foram registradas e preservadas é o de Elvira (306) atual cidade de Granada no Sul da Espanha.
Somente a partir de Constantino, com sua politica fortemente benéfica ao cristianismo, tem inicio por iniciativa dele mesmo a série de Concílios da Igreja Cristã com representantes das igrejas do Ocidente e do Oriente, por está razão chamados de Ecumênicos. O primeiro convocado pelo Imperador é o de Nicéia (325) que tem como objetivo uniformizar os dogmas e práticas dentro da multiplicidade de grupos religiosos que se classificavam como cristãos (YOUNG, 2007). Nesse século IV o cristianismo precisa urgentemente forjar sua identidade pois terá que buscar sua integração no império e na sociedade não mais na condição de conflito e perseguidos, mas de parte integrante deste novo processo histórico. E será na bigorna dos Concílios ou Sínodos que se forjara com muita lagrima, suor e sangue a homogeneização dos dogmas de fé e prática que se constituíram nas muralhas do que vira a se constituir no grande império cristão.
Os Concílios são assembleias amplas em que se fazem presentes os bispos representantes de suas igrejas, ainda que seja possível a presença de outros clérigos e leigos, porém sem direito a voto. A convocação poderia ser feita por um bispo de grande prestígio, por uma autoridade política, mormente pelo imperador de plantão. Uma vez cumprido os requisitos legais eclesiásticos o concílio estava legitimado. A partir de então seus participantes iniciavam os debates de ordem teológica ou disciplinar, que geralmente se conclui em uma norma, sentença ou esclarecimento doutrinal que assume a forma de um cânone pronunciado ao final da reunião, que tem força de decisão colegiada ou conciliar, a qual se sobrepõe a autoridade individual ou local.
Na leitura das discussões e resoluções tomadas nesses Concílios é possível reconstruirmos a configuração que a Igreja Cristã foi tomando na medida em que se configurava a sua identidade assumindo cada vez mais seu aspecto institucional e normativo dos comportamentos dos seus fieis e sua relação com o Estado e a Sociedade na busca de sua legitimidade e hegemonia, o que veio a ocorrer no período final do Império Romano e inicio do que veio a ser denominado de Sacro Império Romano, onde a Igreja Cristã coroava imperadores e reis.

Quadro Sintético dos Sete Concílios Cristão Ecumênicos
Concílio/Ano
Tema Central
Personagens Principais
Resolução
NICÉIA – 325
A Natureza de Cristo dentro da Trindade
Ário, de Alexandria; Alexandre, de Alexandria; Eusébio de Nicomédia.
O imperador Constantino, chamou os bispos para Nicéia. Mais de 300 bispos se fizeram presentes. O credo oferecido por Eusébio de Cesaréia foi rejeitado. Escreveu-se o credo de Nicéia, com as declarações “geradas, não feitas... consubstancial com o Pai (homo-úsios)”. Foram rejeitadas frases arianas, tais como “havia tempo quando ele não era”, e “feito do que não era”. Foram exilados os poucos que não aceitaram a fórmula nicena. A unidade eclesiástica foi o grande objetivo do imperador.

CONSTANTINOPLA - 381
De que forma a humanidade e a divindade se relacionam em Jesus Cristo. Conflito entre a hermenêutica da escola de Alexandria (alegorista) e a de Antioquia (literalista).

Apolinário de Laodicéia; Damário de Roma; Gregório de Nazianzo.  
Houve vários sínodos que se pronunciaram contra o apolinarismo (Jesus tinha corpo e alma humana, mas o espírito era o Logos) defendia a unicidade de Jesus; e Damário e Gregório defendia a dualidade de Jesus, pois ao se encarnar Ele era plenamente humano e plenamente divino. Este concílio também reafirmou as decisões de Nicéia contra o arianismo.
ÉFESO - 431
Qual a maneira que a humanidade e a divindade de Jesus se relacionam. A grande polêmica foi sobre o termo “theótokos” (mãe de Deus/genitora de Deus) e como deveria ser aplicado à pessoa de Maria.
Nestor e Anastácio de Constantinopla, Diodoro de Tarso, Teodoro de Mopsuéstia (escola de Antioquia); Cirilo de Alexandria, Celestino I, bispo de Roma levantaram os contrapontos.  Realça-se a rivalidade crescente entre Roma e Constantinopla pela primazia cristã.
Concílio ecumênico, convocado pelo imperador Teodósio II. Foi um dos mais tumultuados e politizados. Em sessão (junho) liderada por Cirilo (Roma), e dominada pelos bispos do Egito, condenou e depôs a Nestor (Constantinopla). Em no mês seguinte (julho), com a chegada da comissão liderado por João de Antioquia efetua-se a condenação e deposição de Cirilo e seus seguidores. Em agosto, os legados papais (também chegados atrasados) juntaram-se a Cirilo e seus bispos, e declararam depostos não somente Nestor, mas também a João. Ao mesmo tempo condenaram o nestorianismo, o pelagianismo, o messalianismo, assim como mantiveram a condenação do arianismo e do sabelianismo.. Posteriormente Cirilo (Roma) e João (Antioquia) fizeram um acordo (fórmula da unidade), mas Nestor (Constantinopla) não foi convidado a participar e ficou exilado até a morte.
CALCEDÔNIA - 451
Continua a discussão sobre a humanidade e a divindade de Jesus Cristo. Há uma natureza ou duas?
Dióscoro, bispo de Alexandria, Êutico, abade de Constantinopla, Crisápio, capelão do imperador em Constantinopla (Escola Alexandria); do outro lado Flaviano, bispo de Constantinopla, Pulquéria, irmão do imperador e Marciano, esposo de Pulquéria (escola Antioquia), apoiados por Leão, o Grande, bispo de Roma.
Em 449 havia sido realizado o segundo Concílio em Éfeso. Um total fracasso. Após a morte do imperador (Teodósio II) Pulquéria e seu marido Marciano fizeram nova convocação conciliar, agora em Calcedônia. São condenados Êutico e Dióscoro (monofisismo), aprovando a tese de Leão (diofisismo) definindo que existem em Jesus Cristo “duas naturezas em uma só pessoa [hipostática]”. Este concílio encerrou as discussões cristológicas que permearam os três concílios ecumênicos.
CONSTANTINOPLA (2º) 553
O modo em que a humanidade de Cristo se relaciona com a divindade. Os “monofisitas” afirmavam que Cristo tinha uma só natureza.
Egito e Síria (monofisitas – uma só natureza); Basílisco, imperador (475-476); Zenon, imperador (476-491); Acácio, bispo de Constantinopla; Félix III, bispo de Roma (483-492); Justino, imperador e Hormisdas, bispo de Roma; Justiniano, imperador (527-565).
Reafirmação do Concílio de Calcedônia; condenação dos escritos dos monofisitas: Teodoro de Mopsuéstia, Teodoreto de Ciro, e Ibas de Edessa, conhecida como a “Condenação dos Três Capítulos”.
CONSTANTINOPLA (3º) 680/81
Discussão sobre a proposição do monotelismo - afirmava que Cristo tinha duas naturezas, mas uma só vontade.
Sérgio, bispo de Constantinopla, apoiado por Honório, de Roma.
Foi lida uma carta do papa Ágato, que explicava a crença tradicional da Igreja de que Cristo tinha duas vontades, divina e humana e os conciliares concordaram. Macário de Antioquia e o papa Honório, que haviam defendido o monotelismo foram condenados, assim como todos os seus partidários. O concílio, em acordo com a carta de Ágato, definiu que Jesus Cristo possuía duas energias e duas vontades, de modo que a vontade humana de Cristo segue a vontade divina, sem estar em resistência nem, oposição em relação a ela, mas antes sendo subordinada a esta vontade todo-poderosa.  Também foi condenado o monoenergismo. Quando o Concílio terminou, os decretos foram enviados à Roma, onde o sucessor de Ágato, o papa Leão II também concordou com eles[2].
NICÉIA (2º) – 787 - Último dos chamados Concílios Universais e/ou Ecumênicos.
O uso de imagens nas igrejas e no culto.
Os iconoclastas, destruidores de imagens X os iconodulos, adoradores de imagens; imperatriz Irene, Tarásio, bispo de Constantinopola e Adriano, bispo de Roma.

O Concílio (2º de Nicéia, aceito como o 7º Concílio Ecumênico) fez duas coisas: restaurou o uso de imagens nas igrejas e nos cultos, e, diferenciou entre “latria”, a adoração que se deve a Deus, e “dulia”, a veneração inferior que se presta a imagens. Todavia, no Ocidente o latim não possuía duas palavras distintas para adoração (latria e dulia) de maneira que houve muita confusão.


   

Utilização livre desde que citando a fonte
Guedes, Ivan Pereira
Mestre em Ciências da Religião.
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Referências Bibliográficas
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BERKHOF, L. História das doutrinas cristãs. Tradudotores João Marques Bentes e Gordon Chown. São Paulo: PES, 1992.
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GONZALEZ, Justo L. Historia del pensamiento cristiano. Buenos Aires: Methopress, 1965 [v. 1]; La Aurora, 1972 [v. 2]. 2 v. (Biblioteca de Estudios Teologicos).
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HUGHES, P. The Church in crisis; a history of the twenty great councils. Londres: Burns & Oates, 1960.
LOHSE, Bernhard. A fé cristã através dos tempos. Trad. de Sílvio Schneider, rev. de Fausto de Borba Borges. 2. ed. São Leopoldo: Sinodal, 1981.  
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_________. History of the Christian Church: nicene and post-nicene Christianity. Grand Rapids: Eerdmans, 1950.
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_______________. A history of the councils of the Church, from the original documents - Ad 326 to Ad 429. Edimburgo: T. & T. Clark, 1896. (A History of the Councils of the Church, 2).