Creio ser relevante nessas palavras
iniciais começarmos por esclarecer o significado do termo Patrística
e/ou Patrístico (Patrologia) na sua dimensão
etimológica: é a ciência que estuda os Padres – (gr. Patêr),
de onde se derivam pai e padre. Ireneu de Lião em sua obra
clássica Adversus Hareses (4,41,2) escreveu: “Quando
alguém recebeu da boca de outrem um ensinamento, é considerado filho daquele que o instruiu e este
último pode dizer se seu pai.”
E na mesma linha Clemente de Alexandria em seu trabalho Estromatas (I,
I,2-2,1) afirma: “As palavras são a progenitura da alma (...): Assim,
chamamos pais a todos os que nos
ensinam (...) e todo o homem que recebe instrução é, na verdade, filho do seu mestre”.
Tomado
num sentido tradicional Patrística e Patrologia refere-se aos autores cristãos
primitivos, ortodoxos e heterodoxos, bem como a diversidade dos seus escritos. O
primeiro a utilizar o termo Patrologia foi o teólogo luterano João
Gerhard, na obra publicada em 1653, ainda que em sentindo mais amplo, Eusébio
e sua extraordinária obra História Eclesiástica e
que se reveste como fonte extremamente importante, faz citações de escritos
desaparecidos posteriormente e de autores dos quais é a única referência. Igualmente
Jerónimo,
ao escrever o seu De viribus illustris, com propósitos
apologéticos de defesa da literatura cristã perante os pagãos classifica alguns
dos autores como ortodoxos e heréticos. Desta forma, podemos constatar que
houve sempre, desde os primórdios do Cristianismo, a preocupação de conservar
os escritos dos autores primitivos e que, desde cedo se tentou traçar uma
demarcação entre os autores segundo a linha de ortodoxia que se ia,
gradualmente, definindo.
Assim,
a importância do período patrístico não pode ser minimizada sem causar danos
para a compreensão da História da Igreja Cristã. O livro de Atos nos
leva apenas há um pouco mais da metade do primeiro século e depois temos que
buscar informações nas literaturas produzidas pelas gerações sucessoras do
período apostólico. Para compreendermos a evolução da dogmática, da eclesiologia
e da própria história do cristianismo somos obrigados a recorrermos aos
registros literários do período patrístico, pois são as únicas fontes do
cristianismo antigo. Ao resgatarmos o valor desse período histórico cristão e
de sua produção literária histórico-bíblica nos apossamos de uma ferramenta
indispensável para uma melhor compreensão da ação pastoral, evangelística,
teológica, histórica, exegética, litúrgica e dogmática.
No
âmbito de um dialogo intereclesiástica construtivo o período
patrístico torna-se campo comum da história cristã a todas as denominações,
pois conscientemente ou não, a presença da Patrística é irrefutável e inegável
em um cristianismo que percorrerá todos os séculos posteriores até os dias
atuais. A Patrística está entre aqueles raros movimentos espirituais cuja
influência permanece tão fresca no tempo e no espaço.
Os
grandes reformadores do século XVI, bem como os grandes
teólogos
dos séculos posteriores beberam dessa fonte Patrística. Isso não
significa que tudo que foi escrito ou produzido nesse período está inseto de
erros. Ao contrário, é preciso ter muito cuidado em estudar todo esse vasto
material e selecionar aquilo que deve ser aceito e utilizado, daquilo que deve
ser descartado. Mas mesmo em seus equívocos os patrísticos servem para nos
alertar de como é comum grandes pensadores cristãos se desviarem do curso
inspirado das Escrituras e adentrarem por seus próprios caminhos
interpretativos.
Nem
todos os personagens da patrística têm a mesma relevância. Nem todos eles são
conhecidos ou foram estudados da mesma forma. Agostinho de Hipona, por exemplo,
tem sua vida e suas obras enumeradas em vastíssimos volumes. Por
outro lado, outros personagens desse período têm apenas o nome e alguma
referência aos fragmentos de seus escritos.
Deste
modo, o pequeno esforço que faço no âmbito desse singelo blog histórico tem
como objetivo oferecer aos leitores um aperitivo para estimula-los a uma
experiência mais ampla do conhecimento deste banquete histórico-literário
produzido pelos nossos irmãos dos primeiros seis séculos do Cristianismo.
Diante do que esclareci acima os
verbetes que serão produzidos aqui não terão a mesma proporcionalidade. Em
alguns oferecerei mais informações e em outros menos, não por critérios
pessoais, mas por que em muitos casos há poucas informações sobre aquele
personagem. Para evitar um descompasso maior, alguns personagens e temas serão
abordados em verbetes separados de maneira que o leitor poderá acessá-los
quando dispuser de interesse e tempo mais adequado. Na medida do possível
estarei atualizando e ampliando o número de verbetes, pois dois fatores inibem
maiores entusiasmos: o limitado espaço do blog e ao tempo escasso que tenho
para essa tarefa.
A
Abércio, inscrição de (Ásia Menor, séc. II). É o registro
mais antigo referindo-se aos cristãos e suas práticas religiosas, antes do ano
216. Abércio foi bispo da igreja em Hierápolis e que registra em um epitáfio de
forma muito sucintamente sua viagem a Roma e à Síria, percorrendo parte do
percurso feito pelo apóstolo Paulo em sua terceira viagem: Tarso , Derbe , Icônio
, Antioquia da Psídia até a região central da Frígia. Esse monumento foi
descoberto em 1883 pelo arqueólogo protestante W. Ramsay na região da Frígia e
atualmente está preservado no Museu de Latrão. O texto completo contém 22
linhas e muitos autores entre eles Harnack, G. Ficker e A. Dieterich consideram
ser um texto sincretista. O texto faz inferências sobre o batismo como
distintivo dos cristãos; a ampla difusão das comunidades cristãs; Jesus como
filho de Deus (e de Maria); a Ceia sob as espécies do pão e do vinho.
Acácio de Beréia
(atual Alepo – 322-432). Abraçou a vida monástica e pouca informação há sobre
este período de sua vida. Ele parece, no
entanto, ter sido proeminente como um campeão da fé ortodoxa contra os arianos
e posteriormente foi ordenado bispo de Beréia (378), por Eusébio de Samósata, mas
não relaxou o rigor de seu ascetismo e, como Ambrósio, mantinha as portas de
sua casa abertas convidando a todos para testemunhar a pureza e a simplicidade
de sua vida. Participou efetivamente em várias missões importantes aparecendo
com distinção em Roma, provavelmente como deputado das igrejas da Síria, quando
da heresia apolinariana - onde ele defendeu a doutrina das duas naturezas de
Jesus Cristo. Ele estava presente em 381, no Concílio de
Constantinopla. Suas negociações com o papa fez cessar um cisma que
assolaram por 17 anos a igreja de Antioquia. Até então amigo de João Crisóstomo,
veio a se constituir em um de seus mais ferrenhos inimigos, participando com Teófilo
de Alexandria e Severiano de Gabala de todas as manobras que levaram à
deposição e expulsão de Crisóstomo em 404. Sua idade de mais de 100 anos e a
reverência popular lhe aferiu o título de "pai e mestre de todos os bispos" e faleceu com cento e doze
anos. De acordo com Teodoreto de Ciro , que esteve perto dele em seus últimos
anos, foi uma das fontes para a sua "História
Philothea" e ocupou o episcopado de Beréia por 58 anos. Todavia, sua
condução irregular nos assuntos eclesiásticos da Igreja tem produzido as mais
diversas opiniões sobre sua vida e posições teológicas. De todo material por
ele produzido resta apenas três cartas, especialmente sobre a controvérsia
nestoriana: duas para o nestoriano Alexandre de Hierápolis
acerca do acordo que tinha sido estabelecido entre Cirilo de Alexandria e os
bispos de Antioquia e uma para Cirilo de Alexandria em favor de
Nestório e recomendando a paz. É creditada a ele uma confissão de fé que,
presumivelmente, não é dele.
Acácio de Cesaréia
Acácio de Constantinopla
Adamâncio
Aécio
Agostino de Hipona
Alexandre de Alexandria
Ambrósio
Anfilóquio de Icônio
Apeles
Apolinário de Hierápolis
Apolinário de Laudicéia
Ário
Aristides
Aristão [Aristo] de Pella
Atanásio
Atas dos Mártires.
Atenágoras
Utilização
livre desde que citando a fonte
Guedes, Ivan Pereira
Mestre em
Ciências da Religião.
Universidade
Presbiteriana Mackenzie
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Reflexão Bíblica
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Patrística, país da igreja católica.
ResponderExcluirDoutores da igreja, teólogos da igreja católica.
Lembrando de que naquele tempo havia apenas a Igreja Cristã, portanto nao tem por que falar de caroliciamo.
ExcluirGuedes . O primeiro a chamar a igreja cristã de catolica foi santo inacio de Antioquia, bispo de antioquia, discípulo do apóstolo João e, nomeado bispo pelo próprio apóstolo Pedro, portanto já no primeiro século, a igreja primitiva já era catolica. Fato.
ExcluirAmigo, sei que a mensagem é antiga mas vale responder, a palavra católica é originalmente grega e usada também em obras seculares com o sentido de algo "universal", geral, aquilo universalmente aceito, portanto, nós protestantes também somos católicos nesse sentido, o catolicismo da igreja primitiva que estava situada na cultura greco-romana era o mesmo que nós protestantes arrogamos pra si hoje em dia, essa palavra era usada principalmente contra os hereges cismáticos que queriam dizer que a igreja correta era a deles, então teólogos da época se levantavam e cunhavam o termo "igreja católica" pra dizer que a igreja deles é recente e quase não vista, enquanto a verdadeira é a "católica", ou seja, a vista em todos os lugares e a fé geral de todos os cristãos, e nós protestantes concordamos que somos católicos apostólicos protestantes, apenas não costumamos usar esse termo pelo mesmo motivo que os católicos se referem a igreja russa como "ortodoxa" quando na verdade essa palavra significa "ter a verdade", então é bom sempre dar uma estudada pra não falar besteira, a igreja católica antiga é a protestante de hoje, leia os pais das igrejas do oriente um pouco e vai ver como essas doutrinas romanas são invenções sempre querendo tomar o lugar de autoridade da Bíblia sagrada.
ExcluirUm ponto a adicionar, a palavra "católica" era usada em obras seculares de filósofos gregos da mesma época da igreja primitiva, portanto é anacronismo ler essa palavra nos gregos originais dos pais da igreja e querer ligá-la com os católicos romanos.
Excluir