Protestantismo: Breve História dos
Movimentos de Juventude Protestante Mundial (1844-1910)[1]
Os vários movimentos de juventude protestantes surgidos a partir da
segunda metade do século XIX na Europa e nos Estados Unidos tiveram um
impressionante impacto na sociedade de seu tempo. Capazes de mobilizar milhares
de jovens, a influência deste movimento se internacionalizou ganhando os
Continentes. Já em fins do século XIX e início do século XX, ele atingia a
América Latina e o Brasil. Portadores de novas sociabilidades, mais dinâmicas
do que as Igrejas protestantes tradicionais onde as lideranças leigas nem
sempre eram aproveitadas, estes movimentos foram atuantes em duas esferas de
ação: de maneira interna, comunitária, eles se inseriram nas sociedades
protestantes tradicionais não sem encontrar resistência; de forma mais
independente ele resultou na criação de instituições religiosas sem vínculo denominacional,
as chamadas para-eclesiásticas, ecumênicas e proselitistas as quais
constituíam- se em espaços privilegiados para a expressão cúltica, mais
apropriada aos jovens, com ritmos e liturgia próprios. Neste sentido, as para-eclesiásticas
inovaram a vida litúrgica das igrejas ao introduzirem o uso de instrumentos
musicais outros que o órgão e hinários tradicionais das igrejas protestantes, o
emprego de instrumentos acústicos ou elétricos como o violão, guitarra,
baterias, etc., ainda que a maioria dos cânticos empregados estivesse sob a
influência norte-americana. Logo, os movimentos foram assimilados pelas
comunidades protestantes ou então constituíram o motivo de sua dissidência.
Um dos pioneiros movimentos de juventude protestantes criados e ainda em
atividade foi o ilustre Young Men’s Christian Association (Associação Cristã de Moços - ACM), fundada por George Williams, em 1844. Depois de implantadas em vários
países do mundo, seus membros, a maioria formada de estudantes universitários
organizaram, em 1895, uma outra sociedade, a Federação Universal de
Associações Cristãs de Estudantes (FUACE). O movimento contou
com a impulsão do metodista e prêmio Nobel
da paz John R. Mott (1865-1958) e de Karl Fries.
Outro importante movimento de juventude foi a Aliança Mundial das Uniões Cristãs (AMUC). Com seu sistema federativo agrupado ao redor da Base de Paris, em
1855, se constituiu das uniões locais e nacionais masculinas e femininas se
implantando em grande numero de países e conta, atualmente, com milhões de
membros.
O movimento de escoteiros, fundado em 1907-1908 por Robert Stephenson Baden-Powell, tinha por
objetivo influenciar a mocidade inglesa no plano moral, intelectual, físico e
cívico com os valores do Evangelho. Inspirados pelo exemplo protestante outros
movimentos liderados por leigos, católicos e judeus deram uma dimensão mundial
ao movimento.
Depois da Segunda Guerra mundial os movimentos de juventude protestantes
incorporam uma práxis de tipo missionária como a Ação de Jovens por Cristo
(AJC); Campus para Cristo (CC), Operação Mobilização (OM), Inter-Varsity
Christian Fellowship, Jovens em Missão, Grupos Bíblicos colegiais e
universitários. Estes movimentos conversionistas
possuíam como principal estratégia a evangelização pessoal assim como a
edificação espiritual seguida por uma formação bíblica.
Na América Latina duas influencias principais foram precursoras na
criação das sociedades de jovens protestantes: a Associação Cristã de Moços e Mulheres (YMCA e YWCA) e o Esforço Cristão. Enquanto que a primeira se centrava em atividades religiosas e
culturais ligadas á prática do esporte e do ensino do inglês com uma liderança
independente das igrejas protestantes, a segunda atuava no interior das igrejas
procurando o desenvolvimento de um autêntico espírito cristão. A A.C.M. teve
uma inserção bastante precoce no Cone Sul, sob a influência da sessão inglesa
(Buenos Aires, 1874; Rio de Janeiro, 1875; Valparaiso, 1883). Somente mais
tarde, sob influência norte-americana, ela atingiria São Paulo, 1839; México,
1904, Cuba, 1905 e Porto Rico, 1909. Em 1940, quando o uruguaio Humberto Grassi
foi eleito secretário da Federação Sul Americana, a A.C.M. contava com
aproximadamente 42 mil membros. Igualmente de origem norte-americana, o Esforço
Cristão possuía 200 associações, a maioria delas pouco dinâmicas o que levou à
união das federações argentina, chilenas e uruguaias á formação de uma
organização regional, a partir de 1934. Esta resultou na criação, em 1941, em Lima,
da União Latino-americana de Jovens Evangélicos (ULAJE). O Congresso adotou o tema: Com Cristo, um Mundo Novo. Este novo movimento preocupava-se com os problemas atuais e, numa ação
ecumênica condenaram o “atual sistema capitalista fundado
na opressão e na ilegalidade econômica”, reivindicavam a "implantação de um sistema econômico de cooperação” (Bastian, 1994: 178). No Brasil, a Associação Cristã de Moços (A.C.M.) desenvolveu-se graças à
propaganda do presbítero Myron Clark, delegado especial da instituição no país.
Assim, a primeira sociedade de jovens protestantes brasileiros, a Associação
Cristã de Moços (A.C.M.) foi organizada no meio presbiteriano e metodista paulistano em 1865. A experiência ecumênica não se limitou à organização
da A.C.M. Em São Paulo, o exemplo dado pela união da presbiteriana com a
metodista foi seguido pela Sociedade de Obreiros
Cristãos. Esta promovia reuniões de propaganda, sendo
composta de elementos de várias igrejas. Sua diretoria constitui-se em julho de
1895 na ordem que segue: Antônio P. Passos, Benedito Vieira, José Bento Dias
Ferraz, João da Silva Pereira, John Barton.
A segunda influência precursora na criação de sociedades de jovens
protestantes brasileiros foi a sociedade denominada Esforço Cristão (Ferreira, 1959). A sociedade pioneira foi fundada pela missionária
americana Clara Hough, em Botucatu, no ano de 1891. Em 1898, surgiu, em
Curitiba, uma outra sociedade inspirada no Esforço Cristão e do Christian
Endeavor fundada pela missionária norte-americana Elmira Kuhl. O medico R. W.
Fenn veio, em 1900, ocupar no Brasil, o cargo de secretário geral do moviintento.
Dois anos mais tarde uma Convenção Nacional se reuniu em São Paulo formando a União Brasileira de Esforço Cristão, sob a presidência de Erasmo
Braga. Em 1907, Francis E. Clarck, fundador
da sociedade esteve presente na terceira convenção da União Brasileira de
Esforço Cristão, onde organizou, no Rio de Janeiro, a União Sul Americana. Os
presbiterianos Erasmo Braga, Adolfo Hempel e Eliezer dos Santos Saraiva, foram líderes
do movimento na região de São Paulo. Em 1911, o Esforço Cristão contaria com 80
sociedades com cerca de dois mil membros e de um jornal que servia de
propaganda do movimento. Em 1925, organizou- se no Colégio Grambery a União de Estudantes para o Trabalho de Cristo (UETC), transformada posteriormente em União Cristã de Estudantes
do Brasil (UCEB). Sob a influência da A.C.M. e do Esforço Cristão paulatinamente o
número de sociedades de jovens foi crescendo no interior das comunidades protestantes
até que praticamente todas elas já possuíam uma sociedade deste tipo. Nas
décadas de 1930 e na seguinte, a Igreja Presbiteriana Independente dominou o
movimento em âmbito ecumênico. Este contou com a orientação do pastor Eduardo
Pereira de Magalhães, parente do ilustre pastor Independente Eduardo Carlos
Pereira. Este período pode ser considerado como o do início do processo de
nacionalização do movimento de jovens protestantes no Brasil.
Cronologia
das Principais Datas do Movimento Mundial de Jovens Protestantes
1844-
Fundação da Young Men’s Christian Association, por George Williams.
1855- Criação da Aliança
Mundial das Uniões Cristãs.
1895-
Emergência da Federação Universal das Associações Cristãs de Estudantes criada
pelo metodista John Raleigh Mott (1865-1955) e de Karl Fries. Surge um
movimento ecumênico denominado Sociedade de Obreiros Cristãos.
1908- Aparição do Movimento
de Escoteiros fundado em 1908 por Baden-Powell.
1839 -
Fundação, em São Paulo, da Yong Men’s Christianity Association (YMCA) e da Yong
Woman’s Christianity Association (YWCA) influência da sessão norte-americana.
1865 - Organização da
(A.C.M.) no meio presbiteriano e metodista paulistano.
1875 -
Rio de Janeiro, Fundação da Yong Men’s Christianity Association (YMCA) e da
Yong Woman’s Christianity Association (YWCA) influência da sessão inglesa. Fundação, em São Paulo, do Movimento Esforço
Cristão por Francis E. Clarck.
1891- Fundação de uma
sociedade de jovens inspirada no Esforço Cristão pela missionária americana
Clara Hough, em Botucatu.
1898 -
Surge em Curitiba uma outra sociedade inspirada no Esforço Cristão e do
Christian Endeavor fundada pela missionária Elmira Kuhl.
1900 - O médico R. W. Fenn
vem ocupar no Brasil o cargo de secretário geral do movimento Esforço Cristão.
1902 -
Convenção Nacional se reúne em São Paulo formando a União Brasileira de Esforço
Cristão, sob a presidência do presbiteriano Erasmo
Braga.
1907 - Rio de Janeiro,
terceira Convenção da União Brasileira de Esforço Cristão. Organização da União
Sul Americana.
1925 -
Organização no Colégio Grambery da União de Estudantes para o Trabalho de
Cristo (UETC), transformado posteriormente em União Cristã de Estudantes do
Brasil (UCEB).
Organização do primeiro
Congresso Nacional da Juventude Evangélica, sob a orientação do pastor da
Igreja Presbiteriana Independente Eduardo Pereira de Magalhães. O mesmo, depois
de artigos que publicou em jornais evangélicos criou o Comitê de jovens de São
Paulo. Este resultou na criação da Federação da Mocidade da Igreja
Presbiteriana Independente, em uma série de Congressos regionais de jovens, na Associação
de Retiros Espirituais para a Mocidade, e no jornal Bandeirante Cristão.
1936 - Ainda sob a influência de Eduardo Pereira
de Magalhães surge o livro Apreciação e Diretrizes concebido no Congresso
Evangélico que impulsiona a obra entre sociedades protestantes de jovens no
plano ecumênico.
1937 - Instalação da sede da A.C.M à rua Santo Antônio, São Paulo, sob
a presidência do médico Flaminio Fávero, ex-diretor da Faculdade de Medicina e
presbítero da segunda Igreja Presbiteriana independente.
1938-
Primeiro Congresso Nacional da Mocidade Evangélica, Rio dc Janeiro, realizado
na Igreja Fluminense e patrocinado pela Confederação Evangélica do Brasil
(CEB).
1940 — Eleição do uruguaio Humberto Grassi, secretário da Federação
sul-americana da Associação Cristã de Moços (A.C.M.).
Utilização livre desde que citando a fonte
Guedes, Ivan Pereira
Mestre em Ciências da Religião.
Universidade Presbiteriana Mackenzie
me.ivanguedes@gmail.com
Outro Blog
Reflexão Bíblica
http://reflexaobiblica.spaceblog.com.br/
Referências Bibliográficas
ALVES, Rubem. Protestantismo e Repressão. São Paulo:
Ática, 1979.
_____________ (Org.) De Dentro do Furacão, Richard Shaull e os
Primórdios da Teologia da Libertação. São Paulo: CEDI, 1985.
BRAGA, Erasmo de
Carvalho. Pan-Americanismo:
aspecto religioso. Nova
York: Missionary Education Movement of the United States and Canada, 1917.
[Digitized by the Internet Archive in 2014]
BRAGA, Erasmo; GRUBB, Kenneth. The Republic of
Brazil: A Survey of the Religious Situation. London:
World Dominion Press, 1932.
FERREIRA, Júlio
Andrade. História da Igreja Presbiteriana do Brasil, vol. 1 e 2, 2ª ed. São
Paulo: Casa Editora Presbiteriana, 1992.
GUEDES, Ivan Pereira. O
protestantismo na cidade de São Paulo – presbiterianismo: primórdios e
desenvolvimento do presbiterianismo. Alemanha: Ed. Novas Edições
Acadêmicas, 2013.
MATOS, Alderi S. Erasmo
Braga, o protestantismo e a sociedade brasileira – perspectivas sobre a missão
da igreja. São Paulo: Editora Cultura Cristã, 2008.
MOURA, Enos. Do baú
do Enos pai. 1ª ed. São Paulo: PoloBooks, 2018. 364p.
PEREIRA DE MAGALHÃES,
Eduardo. Reconstrução da Ordem Social: A
Mocidade e o Problema Social, 1941.
PIEDRA, Arturo. Evangelização
protestante na América Latina – análise das razões que justificaram e
promoveram a expansão protestante (1830-1960). São Leopoldo: Editora
Sinodal; Equador: CLAI, 2008.
SHAULL, Richard. Somos uma comunidade missionária: oito
estudos de preparação para o testemunho. Secretaria Geral da Mocidade da
Confederação da Mocidade Presbiteriana. São Paulo: Imprensa Metodista, 1957.
SILVA, Hélerson, MOURA, Enos
e MORAES, Mônica. Eu faço parte desta história. São Paulo:
CEP, 2002. [Secretaria de Cultura – Comissão de História da Mocidade – da
Confederação Nacional da Mocidade da Igreja Presbiteriana do Brasil].
Artigos Relacionados
O Protestantismo na Capital
de São Paulo: A Igreja Presbiteriana Jardim das Oliveiras.
Protestantismo um Estudo de
Caso: Apogeu e Declínio da Juventude Presbiteriana (50/60)
Protestantismo: Juventude
Presbiteriana - Willie Humphreys Gammon (Billy Gammon)
Quando o Protestantismo
Brasileiro Foi Inserido no Contexto Internacional https://historiologiaprotestante.blogspot.com/2017/09/quando-o-protestantismo-brasileiro-foi.html
A Igreja Presbiteriana do
Brasil (IPB) e o Conselho Mundial de Igreja (CMI) https://historiologiaprotestante.blogspot.com/2016/05/a-igreja-presbiteriana-do-brasil-ipb-e.html
Que estou fazendo se sou
cristão: Música de Protesto ou Evangelho?
As Mulheres no
Presbiterianismo Brasileiro: Elizabeth Wiggins Simonton
[1] Texto
extraído do livro “Eu faço parte desta História” cf. referências bibliográficas.
Os destaques são meus.
Nenhum comentário:
Postar um comentário