Mesmo
para aqueles que conhecem o mínimo do extraordinário trabalho realizado por
João Calvino, reformador protestante genebrino, que elaborou (e pregou e
lecionou) quase a totalidade dos livros que compõem a Bíblia, resgatar seu
comentário sobre o profeta Ezequiel, toca o coração e a alma, não apenas pela
qualidade de excelência com que ele tratou cada um de seus comentários bíblicos
(e todas suas centenárias obras), mas neste caso em particular pelo fato de
constituir seu último trabalho bíblico, visto que antes de poder envia-lo, após
rígidos critérios de revisão, para ser editado, o amado reformador, que estava
extremamente debilitado fisicamente, veio a falecer, em sua casa, arrodeado
pelos amigos, pastores de Genebra e arredores, bem como de muitos de seus
alunos (detalhes específicos deste momento de despedida leia o artigo indicado
abaixo).
Se
não fosse suficiente a qualidades intrínsecas acadêmica e profundamente pastoral,
o fato de se constituir seu “Canto do Cisne” literário, torna, ainda que
inacabado em sua edição final, parando no capítulo 16, um comentário único em
sua singularidade. Para os mais poéticos como eu, ao ler os textos, é possível
ouvir com o coração e a alma, ainda que distanciados por séculos, o pulsar da
mente e do coração do Mestre (na verdade Doutor) e Pastor João Calvino em seus
últimos esforços de oferecer aos leitores cristãos de sua amada comunidade
genebrina, e aos cristãos reformados espalhados pelo mundo inteiro, irradiados
da Universidade de Genebra por ele iniciada na referida cidade (que ele adotou
e foi adotado, visto sua origem francesa), pois seus escritos continuam sendo lido e
edificando vidas ainda hoje.
Meu
singelo esforço é apenas colocar em porções homeopáticas o conteúdo desta obra,
que, como um bom vinho, quanto mais anos se passam, mais saboroso se torna ao
ser degustado, permitindo que seus aromas sejam apreciados em toda a sua
riqueza e sutileza. Este é um esforço concomitante com sua obra magistral, as Institutas
da Religião Cristã, que você pode acompanhar nos links abaixo.
Com
raríssimas exceções, o propósito maior é deixar o Mestre Calvino falar,
permitindo que seus comentários e mensagens sejam plenamente apreciados. No
entanto, como venho fazendo com as Institutas, inseri algumas poucas
questões para reflexão, com o intuito de oferecer ao leitor uma oportunidade de
pensar um pouco mais sobre os textos por ele apresentados em cada artigo.
Vamos
nos assentar em um dos bancos da Catedral de Saint-Pierre, em Genebra,
Suíça, ou em uma das carteiras da sala de aula de João Calvino na Academia
de Genebra (fundada em 1559, e posteriormente transformada na Universidade
de Genebra após sua morte em 1564, por volta do século XVII). Ali,
com avidez e desejo de sermos edificados, ouviremos suas palavras e cresceremos
na graça e no conhecimento das Escrituras.
Que
o Espírito Santo, que capacitou João Calvino no século XVI, com o mesmo
poder capacitador, ilumine ainda hoje nossos corações e mentes, no século XXI
pós-moderno, para que possamos apreender os princípios e verdades imutáveis da
Palavra de Deus. Amém e amém!
Commentary on Ezekiel
John Calvin
O próprio
Ezequiel explica, logo no início de seu Livro, em que período ele cumpriu
o ofício profético; e disso depende o conhecimento de seu argumento. Pois, a
menos que entendamos como Deus o despertou, podemos com dificuldade entrar em
seu espírito e seremos incapazes de receber qualquer fruto justo de sua
instrução. É necessário, portanto, começar a partir deste ponto: a saber, o
tempo de sua profecia: pois ele diz:
CAPÍTULO 1 |
CAPUT 1 |
Primeira
Lição |
Prima
Lectio |
1. No trigésimo
ano, no quarto mês, no quinto dia do mês (estando eu entre os cativos junto
ao rio Quebar, os céus se abriram e tive visões de Deus. |
1. Et
fuit tricesimo anno, quarto meuse quinta mensis, et ego f22 in
medio Captivitatis, f23 super fluvium Chebar aperti
sunt coeli, et vidi visiones Dei. |
2. No
quinto dia do mês, que foi o quinto ano do cativeiro do rei Joaquim. |
2. In
quinta mensis, ipse est annus quintus captivitatis regis Joiakim. |
PRIMEIRA
LIÇÃO
Ezequiel
explica logo no início de seu livro o período em que exerceu seu ofício
profético; e a compreensão dessa época é essencial para entender sua mensagem.
Pois, se não entendermos como Deus o despertou, dificilmente conseguiremos
captar seu espírito e obter proveito de seu ensinamento.
Vemos
que o Profeta foi chamado ao ofício de Mestre no quinto ano depois que Joaquim
se entregou voluntariamente ao rei da Babilônia (2 Reis 24:15); e foi arrastado
para o exílio, junto com sua mãe: pois foi, diz ele, "no trigésimo
ano". Pois foi,
como ele declara, "no trigésimo ano". A maioria dos
comentaristas segue o parafraseador caldeu, interpretando que essa
contagem começa a partir da descoberta do Livro da Lei. É evidente que esse ano
corresponde ao décimo oitavo ano do reinado de Josias, mas, em minha
análise, não concordo com aqueles que adotam essa data. Afinal, a expressão "o
trigésimo ano" pareceria excessivamente ambígua e forçada. Em nenhum
lugar encontramos registros de que escritores posteriores adotaram essa data
como um padrão. Além disso, não há dúvida de que o método usual entre os judeus
era iniciar a contagem a partir de um Jubileu, pois esse era o marco
inicial para os anos futuros. Por isso, não tenho dúvida de que esse trigésimo
ano foi contado a partir do Jubileu. Minha opinião não é inédita, pois
Jerônimo a menciona, embora a rejeite completamente, por ter sido levado a erro
por uma visão contrária. No entanto, como é certo que os judeus utilizavam esse
método de contagem, iniciando a partir do Jobel, ou seja, do Jubileu,
essa é a explicação mais adequada para o trigésimo ano. Se alguém
objetar que não há registro de que o décimo oitavo ano do rei Josias
tenha sido o ano habitual em que cada um retornava às suas terras (Levítico
25), em que os escravos eram libertos e toda a restauração do povo ocorria,
a resposta ainda assim é simples.
Embora não possamos
determinar com precisão em que ano ocorreu o Jobel, basta atribuir o Jubileu
a este período, pois os judeus costumavam contar seus anos a partir dessa
instituição. Assim como os gregos tinham suas Olímpiadas e os romanos
seus Cônsules, a partir dos quais faziam a contagem de seus anais, os
hebreus também tinham um sistema de referência: costumavam iniciar a contagem
dos anos a partir do Jobel, o ano do Jubileu, e assim seguiam até
a próxima restauração, como mencionei anteriormente. Portanto, é provável que
este tenha sido um ano de Jubileu — é provável, então, que este tenha
sido o Jubileu.
Diz-se que Josias celebrou a
Páscoa com uma pompa e esplendor tão grandiosos que não houve nada semelhante
desde o tempo de Samuel (2 Crônicas 35:18). A explicação mais plausível
para isso não é que ele sempre realizava a Páscoa com tamanha magnificência,
mas que foi levado a fazê-lo por causa da ocasião especial: um momento em que o
povo foi restaurado, voltou às suas terras e os escravos foram libertos. Como
se tratava do Jubileu, o piedoso rei sentiu-se motivado a celebrar a
Páscoa com um esplendor muito maior do que o habitual — chegando até mesmo a
superar Davi e Salomão. Além disso, embora tenha reinado por mais treze
anos depois desse evento, não há registro de que Josias tenha celebrado outra
Páscoa com um esplendor notável. Não há dúvidas de que ele realizava a
celebração anualmente, pois isso era um costume estabelecido (2 Reis 23:23).
Dessa observação, concluímos que essa celebração específica foi extraordinária
e que o ano em questão foi o Jobel. Ainda que isso não esteja
explicitamente mencionado nas Escrituras, é suficiente saber que o profeta
calculava os anos conforme o método tradicional do povo.
Ele afirma que este foi "o
quinto ano do cativeiro do rei Jeconias", também chamado de Jeoaquim.
Jeoaquim sucedeu a Josias e reinou por onze anos. Se somarmos os treze
anos restantes do reinado de Josias e esses onze anos, chegamos a vinte
e quatro anos (2 Reis 23:36).
Seu sucessor, Jeconias,
foi rapidamente entregue ao rei Nabucodonosor e levado cativo logo no
início de seu reinado, governando apenas por três ou quatro meses (2
Reis 24:8). Depois disso, o último rei, Zedequias, foi colocado no
trono por determinação do rei da Babilônia.
E agora devemos considerar a
intenção de Deus ao designar Ezequiel como Seu profeta. Jeremias
havia proclamado a palavra por trinta e cinco anos, mas com pouco
impacto. Deus, então, desejou dar-lhe um auxiliador, alguém que
confirmasse sua mensagem e amplificasse seu alcance. Foi um grande alívio para
Jeremias saber que o Espírito Santo falava através de outro profeta, em
plena harmonia com ele, fortalecendo a verdade de sua pregação.
Jeremias iniciou seu
ministério profético no décimo terceiro ano do reinado de Josias (Jeremias
1:2). Se somarmos os dezoito anos restantes de Josias, os onze
anos de Jeoaquim, mais um ano e outros cinco, chegamos aos trinta e
cinco anos em que Jeremias clamou sem cessar, mesmo diante de um povo
indiferente, ou até insensato.
Para socorrê-lo, Deus
levantou Ezequiel como profeta em Babilônia, proclamando as
mesmas mensagens que Jeremias anunciava em Jerusalém. Sua pregação
beneficiava não apenas os cativos, mas também os que permaneceram na
cidade e na terra. Essa confirmação era essencial para os exilados, pois havia falsos
profetas entre eles, como Acabe, filho de Colaías, e Zedequias,
filho de Maaseias (Jeremias 29:21). Esses homens alegavam possuir o Espírito
de revelação, faziam promessas grandiosas e desprezavam aqueles que haviam
deixado sua pátria. Incentivavam resistência até o fim, afirmando que lutar
pela terra prometida era a única opção digna.
Além deles, havia Semaías,
o nehelamita (Jeremias 29:24), que escreveu ao sumo sacerdote
Sofonias, repreendendo-o por não castigar Jeremias, acusando-o de
falso profeta e impostor. Diante da atuação de tais agentes do engano,
Deus posicionou Ezequiel no exílio, evidenciando o quanto sua missão era
não apenas útil, mas indispensável.
Mas sua influência ia além
dos cativos. Os habitantes de Jerusalém também foram obrigados a prestar
atenção às profecias de Ezequiel, anunciadas na Caldeia. Ao
perceberem que suas mensagens estavam em plena sintonia com as de Jeremias,
inevitavelmente se perguntaram sobre essa impressionante coincidência. Afinal,
não é natural que dois profetas, em locais distintos, proclamem suas
palavras em perfeita harmonia, como dois cantores unindo suas vozes no mesmo
tom.
Essa sincronia entre Ezequiel
e Jeremias forma uma melodia profética inigualável. Agora compreendemos
melhor o significado do que Ezequiel escreve sobre os anos:
"No trigésimo ano, no quarto mês e no quinto dia do mês,
quando eu estava entre os cativos."
Antes de avançar, farei uma
breve abordagem dos temas tratados por Ezequiel. Como mencionei, ele
compartilha muitos aspectos em comum com Jeremias, mas com uma
particularidade: Ezequiel anuncia o último juízo contra o povo, pois
eles continuavam a acumular iniquidade sobre iniquidade, intensificando ainda
mais a ira divina.
Por isso, ele os ameaça
repetidamente, não apenas uma vez, pois o coração endurecido do povo tornava
insuficiente proclamar o juízo de Deus três ou quatro vezes—era necessário
reforçá-lo constantemente. Ao mesmo tempo, Ezequiel expõe as razões pelas
quais Deus decidiu punir severamente Seu povo: estavam contaminados por superstições,
eram perversos, avarentos, cruéis e corruptos, entregues ao luxo e à
depravação. O profeta reúne todos esses aspectos para demonstrar que o
julgamento divino não é excessivo, pois o povo havia alcançado o ápice
da impiedade e da maldade.
Entretanto, em meio às
advertências, Ezequiel também oferece vislumbres da misericórdia de Deus.
Afinal, as ameaças seriam inúteis sem uma promessa de redenção. Se a ira de
Deus se manifestasse sem qualquer esperança, os homens seriam lançados ao
desespero, e este os levaria à loucura. Quando alguém percebe a severidade
do juízo divino, inevitavelmente se angustia e, como uma fera enraivecida,
volta-se contra o próprio Deus.
Por essa razão, afirmei que todas
as advertências são vãs sem um vislumbre da misericórdia divina. Os
profetas não argumentam com os homens senão para levá-los ao arrependimento—e
isso só seria possível se houvesse a certeza de que Deus poderia se reconciliar
com aqueles que dEle haviam se afastado. Assim, tanto Ezequiel quanto Jeremias,
ao repreenderem o povo, temperam sua severidade com promessas de
restauração.
Além disso, Ezequiel
profetiza contra diversas nações pagãs, como Jeremias, incluindo os amonitas,
moabitas, tirios, egípcios e assírios (Jeremias 26-29). A partir do capítulo
quarenta, ele passa a tratar extensivamente sobre a restauração do
Templo e da cidade, anunciando que um novo estado surgiria, no qual
a realeza voltaria a florescer e o sacerdócio recuperaria sua
antiga glória. Até o fim do livro, ele revela as singulares bênçãos de
Deus, que seriam concedidas após o término dos setenta anos de exílio.
Neste ponto, é útil recordar
o que observamos no caso de Jeremias (Jeremias 28): enquanto os falsos
profetas prometiam ao povo um retorno imediato, dentro de três ou cinco
anos, os verdadeiros profetas anunciavam o que realmente aconteceria.
Assim, o povo deveria se submeter pacientemente à correção divina e
entender que o longo período de exílio não deveria abalar sua confiança na
justiça de Deus.
Agora que compreendemos o
que nosso profeta está tratando, bem como a direção e o conteúdo de seu
ensinamento, avancemos para o contexto.
Ele declara: “estando
entre os cativos.” Alguns intérpretes procuram explicar suas palavras de
maneira sofisticada, argumentando que Ezequiel não estava realmente
entre os exilados, mas que essa passagem se referiria a uma visão. Segundo essa
leitura, o termo "entre", no sentido de "no meio",
poderia indicar sua participação em uma assembleia do povo. No entanto,
sua intenção é bem diferente: ele emprega essa expressão para demonstrar que
compartilhava do exílio com os demais, e ainda assim recebeu o espírito
profético naquela terra contaminada.
Portanto, a frase “entre
os cativos” ou “no meio dos cativos” não indica uma reunião pública,
mas simplesmente afirma que, embora o profeta estivesse distante da Terra
Sagrada, a mão de Deus ainda se estendia até ele, concedendo-lhe o
dom profético. Isso refuta aqueles que negavam que Ezequiel já possuía o
Espírito de revelação antes do exílio. Esses críticos não erram apenas por
desconhecimento, mas por pura obstinação, pois os judeus resistiam
profundamente à ideia de que Deus pudesse reinar fora da terra santa.
Até hoje, muitos ainda
mantêm essa rigidez, mesmo dispersos pelo mundo, pois preservam traços do
antigo orgulho. Na época, porém, quando havia esperança de retorno,
considerar a manifestação de Deus fora da Terra Sagrada parecia um sacrilégio,
especialmente se ocorresse fora do Templo. Ezequiel, então,
evidencia que foi chamado ao ofício profético no meio dos exilados,
sendo um deles.
Aqui se revela a inestimável
bondade de Deus, pois Ele chama o profeta do abismo—e Babilônia,
naquele período, era um abismo profundo. Assim, o Espírito Santo surge
com seu instrumento, levantando Ezequiel como mensageiro e
anunciador do juízo, mas também da graça divina.
Portanto, testemunhamos como
Deus faz resplandecer a luz nas trevas, ao convocar Ezequiel ao seu
ministério durante o exílio.
Além disso, embora seu
ensinamento fosse útil aos judeus que ainda permaneciam na terra, Deus
não queria que voltassem a Ele sem antes carregarem um sinal de sua desonra.
Afinal, desprezaram as profecias proferidas no Templo, no Santuário e em
Sião. Agora, as revelações brotariam daquela terra impura, por meio
de um mestre que, como mencionei, estava afundado naquele abismo profundo.
Com isso, Deus castiga o
desprezo do povo por Sua palavra, expondo sua rebeldia. Por muito
tempo, Isaías exerceu o ministério profético, depois veio Jeremias,
mas o povo continuava tão endurecido quanto antes.
Como desprezaram a profecia quando
esta fluía diretamente da fonte, Deus levantou um profeta na Caldeia.
Assim, agora podemos entender o significado completo dessa passagem.
Ele menciona "o rio
Quebar", que muitos identificam com o Eufrates, mas sem
apresentar razões concretas para isso—apenas porque não encontram outro rio
célebre na região. A justificativa oferecida é que o Tigre perde seu
nome ao desaguar no Eufrates, levando alguns a sugerirem que Quebar
seria, na verdade, o próprio Eufrates. No entanto, não há certeza
sobre a localização exata do exílio do profeta: pode ter sido na Mesopotâmia
ou mesmo além da Caldeia. Além disso, como o Eufrates tem muitos
afluentes, é provável que cada um tivesse seu próprio nome.
Diante dessas incertezas,
prefiro deixar a questão em aberto.
Como a visão profética
ocorreu às margens do rio, alguns interpretam que suas águas eram, de certa
forma, consagradas para revelações. Buscando justificativas, argumentam
que a água é mais leve que a terra, e como um profeta deve elevar-se
acima do mundo material, a água seria um elemento adequado para as
manifestações divinas. Outros relacionam isso à purificação,
sugerindo que o batismo estaria prefigurado nesse episódio.
Contudo, deixo de lado tais
sutilezas, pois elas se dissolvem por si mesmas. Evito essas
especulações porque, ao seguir esse caminho, a Escritura perderia sua
solidez. Embora conjecturas desse tipo pareçam plausíveis, devemos
buscar na Escritura ensinamentos seguros e firmes, nos quais possamos
confiar.
Há quem distorça, por
exemplo, a passagem:
"Junto aos rios de Babilônia, ali nos assentamos e choramos" (Salmo
137:1)—como se o povo tivesse procurado as margens dos rios para orar e
cultuar. No entanto, o texto simplesmente descreve a geografia da região,
destacando seus numerosos cursos d’água, como mencionei anteriormente.
Contudo, deixo de lado tais
sutilezas, pois elas se dissolvem por si mesmas. Evito essas
especulações porque, ao seguir esse caminho, a Escritura perderia sua
solidez. Embora conjecturas desse tipo pareçam plausíveis, devemos
buscar na Escritura ensinamentos seguros e firmes, nos quais possamos
confiar.
Há quem distorça, por
exemplo, a passagem:
"Junto aos rios de Babilônia, ali nos assentamos e choramos" (Salmo
137:1)—como se o povo tivesse procurado as margens dos rios para orar e
cultuar. No entanto, o texto simplesmente descreve a geografia da região,
destacando seus numerosos cursos d’água, como mencionei anteriormente.
Ele declara: “os céus se
abriram, e eu vi visões de Deus”. Quando Deus abre os céus, isso não
significa uma abertura física, mas sim a remoção de todo obstáculo que
impeça os fiéis de contemplarem Sua glória celestial. Afinal, mesmo que
os céus fossem rasgados mil vezes, ainda assim a luz divina seria
imensurável.
O sol, embora nos pareça
pequeno, supera em tamanho a Terra; os demais planetas, exceto a
lua, são como centelhas, e o mesmo vale para as estrelas. Assim, se até
a luz natural enfraquece à medida que tentamos penetrar na vastidão do
cosmos, como então poderíamos vislumbrar a glória incompreensível de
Deus?
Portanto, ao abrir os
céus, Deus não apenas remove barreiras, mas também concede nova
visão aos seus servos, permitindo-lhes ultrapassar dimensões que
normalmente seriam inalcançáveis. Foi isso que aconteceu com Estêvão,
ao contemplar os céus abertos (Atos 7:56)—seus olhos foram iluminados por
uma percepção extraordinária. Da mesma forma, no batismo de Cristo,
os céus foram abertos (Mateus 3:16) de maneira que João Batista pôde
ter uma visão elevada e sobrenatural.
No mesmo sentido, Ezequiel
emprega essa expressão, dizendo: “os céus se abriram.”
Ele acrescenta: “eu vi
visões de Deus.” Alguns entendem que isso se refere a visões
extremamente sublimes, porque na Escritura tudo o que é excelente
pode ser chamado de divino—como montes e árvores grandiosas, que
recebem a designação de montes e árvores de Deus. No entanto, essa
interpretação parece limitada. É mais plausível que Ezequiel esteja
se referindo à inspiração profética, declarando assim que foi enviado
por Deus, pois, ao assumir essa missão, ele deixou de lado suas
limitações humanas para se tornar instrumento da revelação divina.
Não surpreende que ele
utilize essa expressão, pois era difícil de acreditar que um profeta
pudesse surgir na Caldeia. Assim como Natanael questionou se alguma
coisa boa poderia vir de Nazaré, (João 1:46), os judeus não
conseguiam conceber que a luz da doutrina celestial pudesse brilhar na
Babilônia ou que um profeta da graça divina surgisse naquela terra
estrangeira.
Essa incredulidade tornava
essencial que o chamado de Ezequiel fosse marcado de maneira clara e
extraordinária.
Ele então menciona que esta
visão ocorreu no quinto ano do cativeiro do rei Jeconias (Jehoiachin,
Jeconias ou Jechanias), destacando a teimosia do povo. Quando Deus castiga
severamente, no início somos abalados, mas com o tempo acabamos
nos submetendo. Contudo, após cinco anos, os judeus ainda não
haviam se humilhado diante de Deus—o que evidencia sua persistência na
rebeldia.
Além disso, aqueles que
permaneceram em Jerusalém se orgulhavam, acreditando que tinham sido
poupados do exílio e por isso desprezavam seus irmãos cativos.
Jeremias frequentemente menciona essa atitude arrogante entre os judeus que
ficaram na terra.
Dessa forma, Ezequiel
enfatiza a data, pois era necessário confrontar essa arrogância, já
que os judeus rejeitaram as profecias de Jeremias. Agora, Deus
levantava um segundo martelo, para parti-los completamente, e esse
martelo era Ezequiel.
Essa é a razão pela qual ele
destaca o quinto ano do cativeiro do rei Jeconias—para expor a
obstinação do povo e tornar evidente a dureza de seu coração diante do
juízo divino.
Se precisar de refinamentos
ou ajustes na linguagem, estou à disposição! 😊✨
Dessa forma, Ezequiel
enfatiza a data, pois era necessário confrontar essa arrogância, já
que os judeus rejeitaram as profecias de Jeremias. Agora, Deus
levantava um segundo martelo, para parti-los completamente, e esse
martelo era Ezequiel.
Essa é a razão pela qual ele
destaca o quinto ano do cativeiro do rei Jeconias—para expor a
obstinação do povo e tornar evidente a dureza de seu coração diante do
juízo divino.
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