O termo “denominação” e/ou
“denominacionalismo” é fundamental para se compreender a expansão do
protestantismo no mundo e sua implantação no Brasil.[1]
A partir do Movimento Religioso
que eclodiu no século XVI e que ficou conhecido como Reforma Protestante a
Igreja Cristã no Ocidente perdeu sua hegemonia, que foi sempre mais aparente do
que de fato.[2]
Todavia, até o século XVI havia uma única Igreja Cristã no Ocidente, mas que
inicia um processo irreversível de fragmentação a partir da Reforma
Protestante, primeiramente ao redor dos líderes reformistas como Lutero e
Calvino e posteriormente a partir de outros movimentos reformistas nacionais,
como por exemplo, a Reforma Religiosa Inglesa promovida por Henrique VIII e que
produziu a Igreja Anglicana.
Esta tendência fragmentária tem
pressupostos inicialmente teológicos, visto que desde o inicio os líderes
reformistas não conseguiram desenvolver uma teologia que pudesse contemplar
todas as formas diferentes de interpretar as doutrinas bíblicas. Um exemplo é a
questão envolvendo a doutrina da Ceia onde os luteranos, os calvinistas e os anglicanos
mantiveram suas interpretações particulares, ainda que em alguns momentos se
dispendesse esforços para uma conciliação. Mas no desenvolvimento histórico
outras questões divergentes vão sendo motivos de distanciamento e mais
divisões.
Será dentro da Igreja Anglicana
que irão surgir algumas subdivisões do protestantismo causadas pelo embrido
teológico-politico. Dentro do movimento Puritano inglês que exigia uma ruptura
plena da Igreja Anglicana em relação ao Catolicismo romano vão surgir diversas
tendências que mesmo compartilhando de uma mesma teologia calvinista, divergiam
quanto a questão da organização eclesiástica: os presbiterianos entendiam que o
governo da igreja local deveria ser representativo através de um Conselho de
Presbíteros eleitos pela assembleia, enquanto que os Congregacionais e também os
batistas defendiam que a Assembleia deveria ter o governo pleno da igreja
local, enquanto que os anglicanos mantiveram o governo episcopal herdado do
catolicismo, assim como os metodistas que surgiram posteriormente.
Depois de muitas lutas e
perseguições, bem como alternâncias no Poder Legislativo da Inglaterra, os
diversos ramos puritanos começam seu êxodo para América do Norte. Ainda que permeados por uma mesma ideologia
teológica, cada segmento religioso protestante vai se expandindo no novo
território. É aqui na América do Norte que o termo “denominação” ou
“denominacionalismo” vai sendo forjado e será predominante no movimento
missionário liderado pelos americanos em todo o mundo.
O Drº Antônio Mendonça analisando
a questão do denominacionalismo protestante formula ao menos três
característicos:
Primeiro,
a denominação americana é uma associação
voluntária o que significa a realização do ideal puritano. [...] A
denominação era uma igreja desestabilizada, composta por pessoas que a ela
aderiam espontaneamente e de acordo com suas preferências e convicções pessoais.
[...] Segundo, a associação voluntária tinha um propósito ou intenção, o
que justificava a existência de denominação diante de outras, com seus pontos a
serem propagados, seus métodos e seus traços definitivos. [...] Terceiro, a
denominação americana de um propósito unitivo
e ecumênico, isto é, nenhuma
denominação se julgava exclusiva dona da verdade. (MENDONÇA, 1984, p. 44-46 –
Itálico do autor).[3]
As denominações foram, portanto
um caminho encontrado para expressar, ou para alguns camuflar, uma unidade
cristã em meio às múltiplas divisões eclesiásticas dentro do protestantismo. Utilizando
as palavras de Niebuhr (1992, p. 13), “o denominacionalismo é, na Igreja cristã
[protestante], essa hipocrisia inconfessada”.
Ao iniciarem seus projetos de
transplantarem suas denominações evangélicas protestantes para o Brasil cria-se
imediatamente um impacto visto que até então os brasileiros conheciam apenas
uma única igreja – a Católica Romana. Ao chegarem as diversas “igrejas”
protestantes, com suas ênfases peculiares teológicas, os brasileiros ficaram
confusos e o catolicismo utilizou por muito tempo este aspecto fragmentário do
protestantismo para questionar diante da população a genuinidade da mensagem
evangélica protestante.
A situação da multiplicação de
denominações evangélicas protestantes apenas demonstra a cada dia a dificuldade
que existe de se aprender a conviver harmoniosamente dentro da mensagem
evangélica proposta pelo próprio Cristo. Com certeza este foi e continua sendo
o maior empecilho para que o protestantismo possa de fato e de verdade produzir
na sociedade brasileira um impacto transformador.
Utilização livre desde que citando a fonte
Guedes, Ivan Pereira Mestre em Ciências da Religião.
Universidade Presbiteriana Mackenzie
me.ivanguedes@gmail.com
Outro Blog
Reflexão Bíblica
http://reflexaoipg.blogspot.com.br/
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2003.
[1] O
termo foi introduzido para combater o termo pejorativo “seita”, que no uso
popular adquiriu conotação de práticas desviantes ou indesejáveis.
[2]
Ainda no século XI, mais propriamente no ano de 1054, ocorreu o Cisma do
Oriente, também chamado de Grande Cisma ou Cisma Ocidente-Oriente, que separou
definitivamente a Igreja Católica Apostólica em Igreja Católica Romana e a
Igreja Ortodoxa.
[3] Doutor
em História Eclesiástica, Duncan Alexander Reily define a denominação como:
“uma associação voluntária de indivíduos com sentimentos e pensamentos em
comum, unidos na base de crenças comuns para o propósito de alcançar objetivos
tangíveis e definidos.” (REYLI, 2003. p. 38 e 39). “Nenhuma insiste que a
totalidade da sociedade e igreja devem submeter-se aos seus regulamentos
eclesiásticos. No entanto, todas as denominações reconhecem sua
responsabilidade pela totalidade da sociedade e esperam cooperar em liberdade e
respeito mútuo com outras denominações e cumprir tal responsabilidade”.
(HUDSON, 1966, p. 32).
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