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segunda-feira, 1 de janeiro de 2018

Ascensão da Igreja Cristã: Uma Tomografia Parcial da Igreja Cristã no Período Antigo (30-313 a.C.)


Escalada Social: Paulatinamente a mensagem cristã foi alcançando as camadas mais elevadas da sociedade imperial. Muitos cristãos acabam ocupando funções públicas de prestígio. Próximo do ano 200 d.C., Abgar, de Edessa, tornou-se o primeiro rei a declarar-se cristão e em 311, Constantino adota o cristianismo como a religião, ainda que única, do Império. Os cristãos começam acumularem riqueza e as comunidades, prosperam e adquirem muitos bens materiais.
Adaptações Doutrinárias e Práticas: A igreja toma uma estrada que a conduzira para o período mais decadente e apostata de sua história nos séculos posteriores da idade média. A simplicidade de seus cultos e das vestimentas de seus líderes foi sendo paulatinamente substituídas pelas vestimentas esfuziantes das religiões pagãs de Júpiter, Serapis e Ísis tão populares em Alexandria na idade teocrática anterior. As liturgias simples centradas na pregação, nas orações e na comunhão, se transformam em cerimônias sofisticadas, centralizadas cada vez mais no sacerdote, no altar e na celebração da missa sacrificial. Criam-se artifícios como água benta, acender velas, raspar a cabeça, ao invés de incentivar os cristãos a uma vida de obediência aos princípios do Evangelho de Cristo.
 Mudando o significado do batismo cristão: ainda cedo se iniciou um processo degenerativo do significado do batismo revestindo-o de um poder mágico. O ato até então simples de obediência à ordenança de Jesus Cristo, vai adquirindo todo um ritual cada vez mais complexo, como descrito no documento primário da Didaquê, o primeiro manual de catecúmenos para novos cristãos:
Agora em referência ao batismo, batizai assim: havendo primeiramente pronunciado todas estas coisas, batizai em nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo, em água corrente. Mas se não tiverdes água corrente, batizai em outra água, e se não puderdes batizar em água fria, então batizai em água morna. E. se não tiverdes água suficiente para a imersão, derramai água em profusão sobre a cabeça três vezes, em nome do Pai, do Pilho e do Espírito Santo. Mas, antes do batismo, o ministrante e o candidato devem jejuar, e quaisquer outras pessoas que puderem; mas ao candidato, mandareis jejuar por dois ou três dias antes de ser efetuado o ato.
Desde Justino Mártir (150 d.C.) a expressão “banho da regeneração” começou a ser utilizado em referência ao batismo. E nos escritos ante-nicenos o vocábulo “regenerar” foi sendo associado diretamente ao ato do “batizar”. 
No fim desse período, a ceia podia ser celebrada somente pelo bispo ou sacerdote. Consistia de pão e vinho (misturado com água).
Catecúmeno: Inicialmente a pessoa recebia o batismo mediante sua profissão de fé e isso perdurou até o meado do segundo século. Com a multiplicação de cristãos sentiu-se a necessidade de oferecer melhor instrução aos novos convertidos, ensinando-lhes as doutrinas fundamentais da igreja. A proposta foi boa, mas infelizmente o resultado foi funesto, pois na medida do tempo a “educação religiosa” passou a substituir o testemunho de uma genuína regeneração, abrindo as portas das igrejas a pessoas que nunca experimentaram a graça de Deus, contribuindo para uma acelerada corrupção da igreja. [o século XVI que o diga].
Mudanças Eclesiásticas: Junto com a mudança da vida cristã, ocorrem também mudanças no ministério e na organização das igrejas. Até ao tempo de Irineu não havia distinção entre os títulos "presbíteros" e "bispos", sendo estes termos empregados como sinônimos. Entretanto, entre os cem anos de Irineu a Cipriano, passaram a designar duas funções distintas. A causa possível é que as igrejas haviam se desenvolvido e tornando suas administrações mais complexas, como por exemplo, a responsabilidade de recolher e distribuir esmolas, que adquiriu proporções consideráveis. Os bispos assumiram esta obrigação e gradualmente foram assumindo uma prerrogativa sobre o corpo de presbíteros, aos quais era confiada a direção das igrejas locais; diante das desavenças entre os presbíteros os bispos passaram a exercer o papel de juiz; paulatinamente caminha-se para um sacerdotalismo, tão comum nas demais religiões. Evidentemente que em sua origem os motivos que estabeleceram estas mudanças são genuínos, mas quando começou a ser empregado pelos sucessores menos dignos redundaram em grandes e lamentáveis abusos.
Mas ao final desse período, não apenas a distinção de presbíteros e bispos, mas outras funções surgem: subdiáconos, leitores, acólitos, zeladores e exorcistas.
Logo surge o conceito da unidade orgânica (externa) paralela à unidade espiritual (interna) como ensinada por Irineu, o que vai demandar uma liderança única sobre todos os demais, de maneira que depois de Cipriano (250) essa possibilidade torna-se cada vez mais real, dando-se os primeiros passos para uma supremacia da Igreja de Roma como centro da unidade de uma igreja universal.
A análise feita pelo escritor brasileiro Rui Barbosa, católico, na introdução de seu livro crítico “O Papa e o Concílio” realça o perigo nefasto dessa tendência de poder centralizador:
Durante a primeira época da igreja, debalde a crítica histórica procura na organização dela as leis e os elementos que hoje lhe servem de base. A unidade não resultava então senão de acordo espontâneo das almas; porque a cristandade era uma pura democracia espiritual, sem centro oficial, sem meios de coação, extrema, sem relações temporais com o estado. A noção pagã de um pontífice máximo seria nesses tempos uma enormidade tal que ainda ao papa Estevão (253-257) negou formalmente Cipriano o direito de sentenciar entre dois bispos divergentes. "Indigna-me", escrevia S. Firmiliano, "a estulta arrogância do bispo de Roma, com presunção de que o seu bispado é herança do apóstolo Pedro". A preponderância que na propaganda se permitia à moral sobre o dogma, deixava à ortodoxia uma latitude hoje inconcebível, e facilitava as reconciliações que o absolutismo unitário de uma autoridade individualmente infalível teria necessariamente impossibilitado. As boas obras eram então o melhor sinal de fé que se não traduzia em fórmulas artificiais, mas na comunicação íntima entre os dissidentes evitavam as cismas, que o refimento centralizador converteu depois em sucessos triviais e persistentes. A simplicidade dos dogmas, a ausência de cerimônias teatrais, a severa proibição das imagens, a pureza do ensino, o martírio dos confessores da fé, a submissão a todos os governos humanos, a aspiração a uma pátria estranha a este mundo, constituíam a mais decidida antítese entre aquela comunidade, vinculada pelos laços morais, e o Catolicismo Romano fundado na ampliação arbitrária dos artigos de fé, nas pompas de um culto faustoso, no enfeitiçamento dos sentidos, no casuísmo, na intolerância, não somente dogmática, mas temporal, na insubordinação contra o poder civil, no pendor do sacerdócio a estabelecer neste mundo um reino seu. A direção dos crentes incumbia aos bispos, eleitos pelos fiéis, aos padres e diáconos; mas ainda assim, considerável era a participação da sociedade leiga no julgamento das questões que interessavam a fé comum. A igreja era o povo, não suplantado, mas livremente unificado ao sacerdócio (1930, p. 23).
Mundanismo: Um documento revelador é o chamado “Cânones dos Santos Apóstolos”, produzido provavelmente no final desse período: o mundanismo predominava entre o clero, pois muitos faziam parte da igreja, mas manifestavam um comportamento totalmente pagão; predominava a imoralidade; os templos cristãos se assemelham cada vez mais aos templos pagãos ricos e suntuosos; as primeiras imagens começam a serem inseridas nos templos com a explicação de que era para substituir as adorações politeístas pagãs.
Analfabetismo: A maior parte dos cristãos continuou no analfabetismo, pois o ensino do catecismo se dava na forma oral/memorização. Poucos membros frequentavam as escolas pagãs. Assim perpetuava-se a liderança daqueles que detinham o conhecimento em detrimento da grande massa de cristãos que permanecia na ignorância literária. Houvesse o cuidado com a alfabetização dessa maioria e certamente a História Cristã que conhecemos seria totalmente diferente. Somente no século XVI com o advento da Reforma Protestante é que os seus diversos segmentos haverão de investir fortemente na educação de seus membros, principalmente as crianças. 
Ascetismo: Muitos cristãos diante do quadro decadente de suas lideranças eclesiásticas e tomados pelo sentimento de desesperança em ver a sociedade salva, buscam uma alternativa para si optando por uma vida ascética de renúncia: ao casamento [um celibato voluntário], comer carne, beber vinho. Nesse primeiro momento ainda permanecia vivendo na sociedade, porém, mais tarde começaram a abandonar o “mundo” retirando-se para os desertos e florestas.
Não devemos generalizar que toda a cristandade estivesse tão corrompida. Uma expressiva parcela da liderança e dos cristãos permanecia firme lutando sinceramente por uma vida cristã autentica sem essa tibieza de moralidade, tanto de costumes como de práticas, com apontamos ao referenciar alguns dos movimentos internos. Além disso, o cristianismo conseguiu restringir o divórcio, abolir a pratica de infanticídio, valorizar o casamento e a vida familiar e restringir ao máximo as condições desumanas dos escravos, beneficiando não apenas as comunidades cristãs, mas a sociedade como um todo.

Utilização livre desde que citando a fonte
Guedes, Ivan Pereira
Mestre em Ciências da Religião.
Universidade Presbiteriana Mackenzie
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Reflexão Bíblica


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