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domingo, 3 de novembro de 2013

PROTESTANTISMO NO BRASIL: Primeiros Contatos e Abertura

     A grande Reforma Religiosa ocorrida no século 16, denominada também de Reforma Protestante, e que abalou e transformou o Continente europeu, respigou no Brasil. Algumas décadas após as iniciativas do monge alemão Matinho Lutero (1483-1546) os ideais religiosos reformados aportaram neste lado esquecido do mundo. Os dois primeiros contatos dos brasileiros, ainda que mais português do que brasileiro, vieram no velho modelo de invasão e domínio, totalmente estranho ao espírito evangélico proposto por Jesus e preservado nos escritos da Segunda parte da Bíblia cristã.
   Os primeiros a fazerem este tipo violento de abordagem foram os franceses, que invadiram e ocuparam o Rio de Janeiro entre 1555 e 1560, estabelecendo o que eles chamaram de França Antártica. Liderados por Nicolau Durand de Villegaignon, de caráter extremamente contraditório e com uma tripulação de desajustados sociais aportam na Baía da Guanabara em 1555. Enfrentado motins e outras dificuldades, o astuto invasor solicita a João Calvino, o reformador de Genebra, que enviasse ao Brasil cristãos protestantes com habilidades para o trabalho e pastores que pudessem doutrinar e instruir tanto os franceses quanto os índios. A Igreja Reformada de Genebra atende ao pedido e envia os pastores Pedro Richer e Guilherme Chartier, acompanhados de outros doze calvinistas. A única intenção de Villegaignon era de apaziguar os revoltosos e amansar os índios através da religião e tudo vai acabar em uma grande tragédia para os religiosos protestantes, cujo dois pastores calvinistas foram os primeiros mártires protestantes em terra tupiniquins, unicamente por razões pessoais do neurótico Villegaignon que via neles um perigo para seus projetos de conquista e poder. Todavia, foram estes calvinistas os primeiros protestantes a realizarem cultos e a celebrarem a Ceia (21 de março de 1557) neste país totalmente católico romano.


A segunda experiência protestante no país não foi menos violenta e traumática, agora com os holandeses que chegaram a controlar grande parte do atual Nordeste brasileiro entre os anos de 1630 e 1654. A grande motivação não foi religiosa, mas econômica, pois nesta região do Brasil estavam os grandes produtores de açúcar. Os invasores pertenciam à Companhia das Índias Ocidentais[1] que entre saques aos usineiros de açúcar e delapidação dos templos católicos com seus adornos preciosos, implantaram a forma cúltica protestante conduzida pelo pastor Enoch Sthertenius. Expulsos da Bahia eles retornam cinco anos depois e dominam as cidades de Recife e Olinda (PE), onde se estabelecem e transmutam os templos católicos em templos protestantes, introduzindo a forma protestante de culto e ensino religioso e durante vinte e quatros anos estes holandeses avançaram por outros lugares da costa brasileira chegando ao Maranhão e Sergipe. Apesar do inegável interesse politico, comercial e de dominação, este período marca, ainda que a ferro e fogo, a presença protestante no Brasil. Diferentemente da invasão francesa, os holandeses foram muito mais efetivos em sua ação protestante, conforme atestam tanto a historiadora Elizete da Silva quanto o pastor e historiador protestante holandês Frans Leonard Schalkwijk, em que durante o governo de Mauricio de Nassau houve um período excepcional de tolerância religiosa, onde protestantes não apenas holandeses, pois em Recife havia uma Igreja Anglicana (ingleses) e uma Igreja Francesa, bem como sinagogas (judeus) e católicos romanos (com suas missas e festas) livremente manifestavam suas expressões religiosas sem qualquer restrição ou perseguição. Com a saída de Nassau o domínio holandês entra em declínio rapidamente e as forças portuguesas e brasileiras reconquistam os territórios invadidos e expulsam os invasores, definitivamente em 1649. 
     Imediatamente a Igreja Católica Romana restabelece a hegemonia religiosa, proibindo toda e qualquer outra manifestação de fé, implantando de forma implacável a cartilha da horrenda Inquisição Religiosa. O Brasil fica totalmente isolado de todos os movimentos religiosos, sociais e políticos que estão influenciando e transformando o mundo europeu e americano. Desta forma melancólica e frustrante se finda mais um capítulo, ao gosto popular brasileiro, da novela protestante no Brasil, mas ainda que com um intervalo de um século e meio, novos capítulos e com conteúdo mais pospositivo começarão a serem escritos. 
     Evidentemente que estas duas tentativas frustradas, ainda que deixassem marcas positivas indeléveis na consciência dos habitantes brasileiros apenas serviu para aumentar substancialmente todo o arsenal de preocupações das autoridades portuguesas quanto aos invasores com sua religião protestante. Após repelir estes dois grupos invasores anticatólicos, tudo e todos estrangeiros com qualquer resquício de religião protestante passaram a serem vistos como invasores e deveriam ser imediatamente combatidos e extirpados, de maneira que toda estruturada religiosa protestante foi extinta, e o catolicismo retoma com força total sua catequese e assim permaneceria até as últimas décadas do século XIX. Mas dois acontecimentos históricos de suma importância para o Brasil e os brasileiros trarão uma luz no final do túnel da implantação definitiva do protestantismo tupiniquim: a transferência da Família Real Portuguesa e a Independência do Brasil. 



Utilização livre desde que citando a fonte
Guedes, Ivan Pereira Mestre em Ciências da Religião. 
Universidade Presbiteriana Mackenzie
ivanpgds@gmail.com
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Referências Bibliográficas
BONINO, José Míguez. Rosto do protestantismo latino-americano. São Leopoldo: Sinodal, 2003.
LÉONARD, Émile-G. O protestantismo brasileiro: estudo de eclesiologia e história social. 2ª ed. Rio de Janeiro e São Paulo: JERP/ASTE, 1981.
MATOS, Alderi Souza de. Erasmo Braga, o protestantismo e a sociedade brasileira – perspectivas sobre a missão da igreja. São Paulo: Editora Cultura Cristã, 2008.
MENDONÇA, Antonio Gouvêia e VELASQUES FILHO, Prócoro. Introdução ao protestantismo no Brasil, 2ª ed. São Paulo: Loyola, 2002.
RIBEIRO, Boanerges. Protestantismo no Brasil monárquico (1822-1888): aspectos culturais da aceitação do protestantismo no Brasil. São Paulo: Pioneira, 1973.
SCHALKWIJK, Frans Leonard. Igreja e Estado no Brasil holandês (1630 a 1654), 3ª ed. São Paulo: Cultura Cristã, 2004 (1986).
SILVA, Elizete da. Protestantismo e questões sociais. Sitientibus, Feira               de Santana, nº 14, 1996, pp. 129-42. Disponível em: http://www2.uefs.br/sitientibus/pdf/14/protestantismo_e_questoes_sociais.pdf
SOARES, Caleb. 150 anos de paixão missionária – o presbiterianismo no Brasil. Santos (SP): Instituto de Pesquisa Cristã, 2009.
VIEIRA, David Gueiros. O protestantismo, a maçonaria e a questão religiosa no Brasil. Brasília: Editora da Universidade de Brasília, 1980.



[1] Organização colonizadora e mercantil criada pelos holandeses com um propósito bem especifico de suplantar os portugueses no Brasil. Apesar da religião de cunho protestante estar presente e até mesmo de desenvolver algumas ações relevantes, nunca foi o fator determinante deste projeto.

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