A relevância do estudo da história do
protestantismo na América Latina tem avançado significativamente nas últimas
décadas. Muitas tem sido editada, como pode ser constatada de forma insipiente
nas referências bibliográficas, mas o suficiente para abrirem nossas
perspectivas e enriquecer nosso conhecimento. Entretanto, torna-se premente que
todo este esforço e avanço literário-acadêmico seja transformado em uma
consciência permanente da importância e do significado que esse protestantismo
representa na história da população latino-americana.
O presbiterianismo se expandiu pelo mundo e alcançou as Américas
Central e do Sul. Aqui particularmente como resultante de um movimento
heterogêneo de escoceses, ingleses e americanos, tendo
como marca distintiva o estabelecimento de forte laços colaborativos iniciais
com os setores liberais. Desta forma, na maioria dos casos, sempre há exceções,
os elementos característicos dos princípios da Reforma (séc. XVI), como
desenvolvidos na Europa, foi transvestida de uma bandeira cultural e política
com uma ênfase civilizatória que se por um lado abria muitas portas, por outro
lado erguia enormes barreiras por parte das elites nacionalistas, que viam
neste movimento religioso muitos aspectos de um novo colonialismo estrangeiro,
bem como a dificuldade de rompimento com seus laços umbilicais com o catolicismo
romano predominante até então. Entretanto, a expansão missionária protestante
se manteve, em graus diferenciados, por toda extensão das Américas. O primeiro
país da América do Sul a receber denominações protestantes foi o Brasil no
final dos oitocentos e início dos novecentos. Uma das primeiras denominações a
se estabelecerem e desenvolverem no país foi a Presbiteriana.
Em
contraste com o desenvolvimento do protestantismo presbiteriano brasileiro, a
história presbiteriana na Argentina, segunda maior nação da América do Sul
é desanimadora. Distintamente do Brasil que foi dominada pelos portugueses, o
território argentino foi conquistado e monopolizado pelos espanhóis. Ainda que
ambas as nações conquistadoras fossem Católica Romana, os espanhóis eram muito
mais aguerridos em sua religião. Este país permaneceu sob domínio espanhol até
1816. Mas seu processo de estabilidade política foi prolongado até a adoção de
uma constituição em 1853, ainda que Buenos Aires, a maior cidade, não se
submeteu à autoridade de um governo nacional até 1880.
Durante
a maior parte do século XIX, o país vive em turbulência, e a Igreja Católica
Romana, que vivia à sombra do poder espanhol, e que detinha o pleno domínio
religioso foi gradativamente perdendo credibilidade devido à má qualidade geral
de seus clérigos e à negligência geral de seus membros (nesse quesito muito
semelhante ao caso brasileiro).
Os
anos de 1808 a 1825 demarca o abalo sísmico do Catolicismo Romano na América
Latina, e ao final do período colonial, a Igreja sofria de uma situação de expressiva
fragilidade sem a “proteção” governamental, tanto política como institucional.
Para os pensadores liberais influenciados pelo iluminismo francês que aspiravam
o engrandecimento de suas incipientes nações independentes, o modelo
representado no catolicismo romano demonstrava ser incapaz de alavancar esse
ciclo virtuoso, procura-se então um novo modelo – adota-se então o modelo
protestante anglo-saxão, cuja nação dos Estados Unidos era um exemplo de junção
entre religião e progresso.
Portanto,
muito antes das teses de Max Weber, sobre a ligação umbilical entre o
protestantismo e o espírito do capitalismo tornarem-se famosas, os liberais
latino-americanos já tinham descoberto que o viés religioso protestante era
muito mais compatível com o capitalismo incipiente do que o velho e carcomido
catolicismo romano.
De
forma incipiente podemos dizer que em uma primeira etapa (1829 a 1912), o presbiterianismo
se desenvolveu, não com missionários propriamente dito, mas principalmente
através da chegada de muitos escoceses (mormente de origem presbiteriana) que
vieram como imigrantes para trabalhar nas diversas empresas britânicas
estabelecidas aqui. O idioma dos cultos e reuniões era o inglês.
Aqui
temos a figura marcante do Rev. William Brown,[1]
pastor de 1827 a 1849, que construiu a Igreja e a Escola San Andrés (seu nome
oficial atualmente é Iglesia Presbiteriana San Andrés). Posteriormente o
sucedeu o Rev. James Smith de 1850 a 1883 e que liderou uma forte ênfase
missionária dando origem a várias igrejas: San Juan, Florencio Varela (1854),
Igreja Rancho de Chascomús (1857), a Capela Jeppener (1868) e a nova Igreja e
Cemitério de Chascomús (1872). Quando o pastor James Smith renunciou, o Rev.
James Fleming que havia sido seu assistente foi nomeado, permanecendo de 1925
até o ano de sua morte.
O Rev.
J. Fleming teve a percepção e sensibilidade correta de que a expansão da igreja
dependia de uma mudança idiomática, visto que os filhos e netos dos originais escoceses
eram mais versados no espanhol do que no inglês, de maneira que começa a
ministração dos cultos e reuniões também em espanhol. Para completar
efetivamente a mudança de paradigma idiomático ele providência um pastor
Presbiteriano espanhol, Rev. José Felices (1912), cujo ministério longevo se
mostrou bastante frutífero, falecendo no ano 1941.
Dentro
do escopo mais amplo do iniciante Protestantismo argentino não podemos deixar
de mencionar o trabalho excepcional desenvolvido por James Thomson (1788-1854).
Seu nome era James, mas havia o costume de sempre traduzir nomes, de maneira
que "James" tornou-se "Diego", como aparece
em todos os documentos em espanhol. Por onde quer que fosse, Thomson “James”,
vinculou seu interesse pelas escolas ao seu interesse na distribuição das
Escrituras, embora tenha se tornado oficialmente um agente da BFBS - British
and Foreign Bible Society (Sociedade Bíblica Britânica e Estrangeira)[2]
somente a partir do final de 1824.
Ele
chega em outubro de 1818, em Buenos Aires, Argentina. Ele tinha trinta anos.
Era um batista escocês dinâmico que estava a serviço da Sociedade Bíblica
Britânica e Estrangeira, e por esta razão percorre a imensa geografia
latino-americana com o objetivo de colocar a Bíblia em circulação e contribuir
para o progresso educacional das jovens nações deste continente, implantado um
sistema educacional desenvolvido pelo Quakers.[3]
Em correspondência informa que chegou a Buenos Aires em 6 de outubro de 1818.
Ele o fez depois de ter embarcado em Liverpool (Inglaterra), de onde navegou
doze semanas e três dias. E na maior parte desta longa viagem (três meses) este
muito doente. Pouco depois de chegar, ele entra em contato com pessoas
relevantes do governo argentino a quem propôs adotar o sistema Lancaster[4]
de educação no país.
A igreja Romana, enfraquecida e em aberto conflito com os Liberais não encontra forças para barrar as atividades de Thomson. Por outro lado, o governo nacional apreciou tanto o trabalho do missionário escocês na área da educação que lhe conferiu a cidadania honorária, assim como o país vizinho Chile.
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Presbiteriana Jardim das Oliveiras.
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[1]
Rev. Brown escreveu extensivamente sobre temas bíblicos, incluindo livros,
artigos acadêmicos e ensaios. Havia exercido docência como Professor de Antigo
Testamento no Columbia Theological Seminary.
[2]
Ela foi fundada em 1804, em Londres, com o propósito de tornar a Bíblia
acessível a todas as pessoas, em qualquer lugar do mundo, por meio da tradução,
publicação e distribuição das Escrituras.
[3]
Os primeiros estabelecimentos educacionais Quakers na Inglaterra, em 1668, se
destacavam por enfatizar habilidades práticas e princípios éticos, ao invés de
focar apenas nos estudos clássicos
[4]
O sistema Lancasteriano, também conhecido como método monitorial, foi
desenvolvido por Joseph Lancaster no final do século XVIII. Este método foi
criado para atender a necessidade de ensinar um grande número de alunos de
forma eficiente e econômica. Utilizando os alunos mais avançados para dar
suporte aos alunos mais jovens ou menos desenvolvidos.