Introdução
O
Presbiterianismo aportou oficial e efetivamente no Brasil com a chegada do
jovem missionário americano Rev. Ashbel Green Simonton, com apenas 26 anos, que
desembarca no porto do Rio de Janeiro em 12 de agosto de 1859, que passou a ser
a data fundante e comemorativa da Igreja Presbiteriana do Brasil.
Simonton
realiza um trabalho intenso, como que prevendo a brevidade de suas atividades
missionárias que seria tolhida por sua morte precoce aos 34 anos. Mas em tão
pouco tempo, oito anos e quatro meses, ele conseguiu deixar uma herança de
valor incalculável para a futura Igreja Presbiteriana brasileira.
Inicia seu trabalho, no Rio de janeiro,
de forma simples à semelhança de seus predecessores, atuando como um capelão
entre os de língua inglesa, tanto em navios quanto no bairro da Saúde (RJ),
dando assistência a uma Escola Dominical a um grupo de operários atendidos
anteriormente por Fletcher[1] em 1855, eram ingleses,
escoceses e irlandeses; ele também viaja a outras cidades. Já tendo a companhia
de seu cunhado e missionário Alexander L. Blackford, que organizaria as Igrejas
de São Paulo (março de 1865) e Brotas (novembro de 1865), ele empreende uma
longa viagem pela província de São Paulo, ao final de 1860 e início de 1861,
visitando as colônias de anglo-saxões e alemães, bem como fazendo colportagem
de Bíblias e outros materiais evangélicos.
Retornando ao Rio em maio de
1861 começa a fazer as primeiras pregações em português, em uma pequena sala no
centro do Rio de Janeiro. Somente depois de dois anos e meio, ele realiza seus
primeiros batizados, em 12 de janeiro de 1862, demarcando a fundação oficial da
primeira Igreja Presbiteriana no Brasil. Ele registra este momento em seu
diário no dia 14 de janeiro:
No
Domingo, 12, celebramos a ceia do senhor, recebendo por profissão de fé Henry
E. Milford e Cadoso Camilo de Jesus. Assim, organizamo-nos Igrejas de Jesus
Cristo no Brasil. Foi uma ocasião de alegria e prazer. Muito antes que minha
pequena fé esperava. Deus permitiu-nos ver a colheita dos primeiros frutos de
nossa missão. Sinto-me agradecido, de certa maneira, mas não tanto como deveria
sentir-me. A comunhão foi ministrada pelo Sr. Schneider e seu, em inglês e
português. O Sr. Cadoso, a seu próprio pedido e de acordo com o que nos também
julgamos melhor, depois de muito pensar e hesitar, foi batizado. Seu exame foi
bastante satisfatório para o Sr. Schneider e para mim, e não deixou dúvida
quanto à realidade de sua conversão. Graças a Deus nossa débil fé foi
confirmada ao vermos que não pregamos o evangelho em vão. (RIZZO, 1962, p.82).
De acordo com a Ata da Igreja
de 15 de maio de 1863, faz se o registro da organização da Igreja Presbiteriana
do Rio de Janeiro, por meio da Missão do Norte, para fins legais [1] conforme
menciona Simonton em seu relatório de 10 de julho de 1866:
A 15 de maio de 1863 vem a ponto esclarecer, reuniram-se
pela primeira vez em Assembléia Geral os membros da Igreja Evangélica
Presbiteriana do Rio de Janeiro ( este o seu nome primitivo a partir de sua
fundação, a 12 de janeiro de 1862), não dá para se constituir em Igreja,
entidade coletiva já existente, e, sim, diz Simonton em seu relatório de 10 de
julho de 1866 textualmente: “para formular e assinar certidões declarativas de
serem Alexander L. Blackford, A.G. Simonton, e F. J. Schneider pastores da
Igreja Presbiteriana do Rio de Janeiro. A vista destas certidões, os títulos
dos mesmos pastores foram registrados pelo Governo e seus atos, feitos de
conformidade com a lei civil, garantidos principalmente em relação ao casamento
de pessoas que não professassem a religião do Estado. (RIBEIRO, 1940, p.13 e
14, Apud, CLARK, 2005, p. 101 – grafia da época).
Contando com seus outros dois
grandes colaboradores Francis J. C. Schneider, que trabalhava entre os
imigrantes alemães em Rio Claro, lecionaria no futuro Seminário do Rio e seria
missionário na Bahia e George W. Chamberlain, grande evangelista e operoso
pastor da futura Igreja de São Paulo, Simonton empreende suas maiores
realizações: fundou o primeiro periódico evangélico do país (Imprensa
Evangélica, 1864), que subsistiu por 28 anos; criou o primeiro Presbitério
(1865)[2], na rua São José onde estava funcionando a então primeira igreja da
capital paulista, composto pelas Igrejas
do Rio de Janeiro, São Paulo e Brotas; coube a ele também o privilégio de
organizar o primeiro Seminário, chamado de “Seminário Primitivo” (1867), o qual
formaria os primeiros pastores presbiterianos[3] e ainda deixou funcionando uma
escola paroquial que se constituía em um instrumento fundamental na estratégia
missionária americana.[4] Mas sem dúvida alguma, sua maior alegria e realização
foram participar da ordenação de José Manoel da Conceição, o primeiro pastor
presbiteriano brasileiro (1865).[5]
Ainda fortemente abalado pelo
falecimento de sua amada esposa, Helen Murdoch (1864), em decorrência do parto
de sua única filha - Helen Murdoch Simonton - o Rev. Ashbel Green Simonton
morre vitimado pela febre amarela, em 1867, aos 34 anos, e apesar da brevidade
de seu ministério contribuiu de forma impar no desenvolvimento do
presbiterianismo brasileiro e na implantação da Igreja Presbiteriana do Brasil.
Dois dias antes de sua morte, sua irmã perguntou se tinha alguma palavra à sua
igreja no Rio. Simonton replicou: “Deus
levantará alguém para tomar o meu lugar. Ele usará os seus instrumentos para o
Seu trabalho”.
O corpo do jovem missionário
após ser velado é conduzido em cortejo fúnebre partindo da esquina do Largo de
São Bento com Rua São José, n° 1, hoje Líbero Badaró, descendo a Cásper Líbero,
subindo a São João, entrando na Avenida Ipiranga e finalmente subindo a
Consolação, para ser sepultado no Cemitério dos Protestantes, ao lado de sua
jovem esposa Helen Murdoch que havia sido sepultada três anos antes. (Apud,
SOARES, 2009, p. 187).
O jovem missionário americano,
que por tão breve tempo esteve desenvolvendo suas atividades no Brasil,
conseguiu cativar e impactar até mesmo aqueles que o viam como um herege e um
perigo para a religião majoritária O
jornal católico "O Apóstolo", que por tantas vezes se opôs de forma
contundente às atividades dos missionários protestantes capitaneados na pessoa
de Simonton, coloca uma nota sobre a morte precoce deste valoroso protestante: "... sempre mantivemos o devido
respeito por nosso ilustre adversário, e é de coração nossa triste pela morte
do ilustre editor da Imprensa Evangélica" (FERREIRA, 1992, V. 1, p.
89).
Deste modo, o documento
transcrito abaixo, elaborado por Simonton em 1867, ou seja, apenas oito anos
após sua chegada ao país, revela sua analise do que havia sido feito e sua
perspectiva do que poderia vir a ser realizado por ele e seus companheiros
missionários e os pastores nacionais que já estavam somando seus esforços.
Na leitura do documento é
perceptível a visão positiva que o jovem missionário tem do vasto campo
brasileiro; não tem uma visão romântica do empreendimento missionário, ao
contrário, demonstra plena consciência das enormes dificuldades que a nascente
igreja terá que enfrentar, se de fato pretende expandir-se no Brasil; suas
propostas, apesar da distância histórica de mais de 150 anos, continuam sendo
relevantes para o presbiterianismo nos dias atuais.
A leitura deste documento
torna-se imprescindível para todos aqueles que desejarem pesquisar sobre a
implantação do presbiterianismo ou mais especificamente sobre o
presbiterianismo no Brasil.
Utilização livre desde que citando a fonte
Guedes, Ivan Pereira Mestre em Ciências da Religião.
Universidade Presbiteriana Mackenzie
me.ivanguedes@gmail.com
Outro Blog
Reflexão Bíblica
http://reflexaoipg.blogspot.com.br/
Notas
[1] Para que os atos
civis dos Missionários e pastores pudessem ter valor legal era preciso fazer o
registro deles na Secretaria do Império, conforme Artigo nº 52, do Decreto
nº3069 de 17 de abril de 1863 do Governo Brasileiro.
[2] Ferreira registra
este ato constitutivo: “Nós, Ashel G.
Simonton, do Presbitério de Charlisle; Alexandre L. Blackford, do Presbitério
de Washington; e Francisco J. C. Schineider, do Presbitério de Ohio, querendo
melhor promover a glória e o reino de nosso Senhor Jesus Cristo no Império do
Brasil, julgamos útil e conveniente exercer o direito que nos confere a
Constituição de nossa Igreja, constituindo um Presbitério sob o governo e
direção da Assembleia Geral da Igreja Presbiteriana dos Estados Unidos da
América do Norte. Portanto, de conformidade com a referida Igreja, de fato nos
constituímos em um Presbitério que será chamado pelo título de Presbitério do
Rio de Janeiro, o qual deverá estar anexo ao Sínodo de Baltimore”. (1992,
v. 1, 2ª ed., p.59)
[3] Após a formação do
primeiro Presbitério (1865) o passo seguinte era criar o primeiro Seminário
Presbiteriano para formação de pastores nacionais que haveriam de substituir os
missionários que voltassem para seu país de origem. Este Seminário vai surgir e
funcionar inicialmente no Rio de Janeiro, no Campo de Sant’ana, nº 49, e será
chamado carinhosamente de “Seminário Primitivo” e Simonton registra em seu
diário: “Aluguei uma casa com sala ampla,
boa para pregações; outra para imprensa e alojamento para os nossos estudantes
e para as famílias de dois impressores. Tudo por 150 mil réis por mês. É muito
razoável. Pelo menos trinta pessoas a mais poderão estar assentadas. Tal
mudança se faz necessária pelo aumento animador dos auditórios. Quando tivermos
de mudar outra vez, espero que seja para lugar definitivo”. (SIMONTON,
1867, apud, RIZZO, 1962, p. 163). Clark trata em detalhes o funcionamento deste
primeiro Seminário Presbiteriano (2005, p. 113-117).
[4] O binômio
“evangelizar e educar” caracteriza a estratégia missionária dos protestantes
que se instalaram no Brasil durante o século XIX. Em relação às escolas havia
três tipos conforme Mesquida: as escolas paroquiais; as escolas dominicais; e
os colégios. As primeiras alcançavam os grupos médios e periféricos da
sociedade; as segundas dedicavam-se à instrução religiosa nas igrejas; os
terceiros alcançavam as elites (1994, p. 138-139). A primeira ação de Simonton
foi formar a escola dominical e em seguida iniciou uma escola paroquial. O
colégio veio posteriormente com um de seus colaboradores, o Rev. Chamberlain e
sua esposa Mary Ann, em São Paulo. O comentário de Clark sobre a repercussão
desta pioneira escola paroquial de Simonton é interessante: “Simonton, ao criar sua escola, não tinha
ideia de que a mesma atrairia a atenção de tantos brasileiros católicos. Embora
a escola tivesse fins religiosos e dogmas diferentes do catolicismo, muitos
pais solicitaram a permissão para que seus filhos pudessem frequenta-la e ali
receber instrução” (CLARK, 2005,p.98).
[5] Lessa registra este
momento ímpar do presbiterianismo brasileiro: “Em 16 de dezembro de 1865 constitui-se, em S. Paulo, o Presbyterio do
Rio de Janeiro, do qual faziam parte os reverendos Simonton, Blackford e
Schneider. No dia seguinte, 17 de dezembro, o antigo vigario era solennemente
ordenado pela imposição das mãos do Presbyterio organizado na vespera.. Estava
realizada a grande aspiração do reverendo Conceição, que foi contado como
primícias do ministerio evangelico nacional”. (1938, p.28 – grafia da
época).
Referências
Bibliográficas
BONINO, José Míguez, Rosto do protestantismo
latino-americano. São Leopoldo: Ed. Sinodal, 2003.
CLARK, Jorge Uilson. Presbiterianismo do Sul em
Campinas: primórdio da educação liberal. Tese (Doutorado) Universidade Estadual
de Campinas Faculdade de Educação: Campinas, 2005. Disponível em:
http://www.bibliotecadigital.unicamp.br/document/?code=vtls000351752&opt=4.
Acesso em: 21/05/2013.
FERREIRA, Júlio Andrade. História da Igreja
Presbiteriana do Brasil, vol. 1 e 2, 2ª ed. São Paulo: Casa Editora
Presbiteriana, 1992.
LESSA, Vicente Themudo. Annaes da Primeira
Egreja Presbyteriana de São Paulo – Subsídios para a História do
Presbiterianismo Brasileiro. São Paulo: Ed. Primeira Igreja Presbiteriana
Independente de São Paulo, 1938.
RIBEIRO, Domingos. História da Igreja
Presbiteriana do Brasil. 1940: Apollo
RIZZO, Maria Amélia. Simonton – inspirações de
uma existência. São Paulo: Editora Rizzo, 1962.
SOARES, Caleb. 150 Anos de paixão missionária –
o presbiterianismo no Brasil. Santos (SP): Instituto de Pedagogia Cristã, 2009.
DOCUMENTO
OS MEIOS
NECESSÁRIOS E PRÓPRIOS PARA PLANTAR O REINO DE JESUS CRISTO NO BRASIL
Lido perante o Presbitério
do Rio de Janeiro no dia 16 de julho do 1867.[2]
A. G. Simonton
O
fim a que nos propomos é vasto e importante, além do que podemos conceber.
Todavia ele c simples c muito bem definido. Pretendemos tornar conhecido o
evangelho e trazer o povo do Brasil a submeter-se a Jesus como seu único
Salvador e Rei. Em outras palavras, temos em vista evangelizar no Brasil a paz
que é o fruto da paixão, morte e intercessão de Jesus Cristo, a fim do que
todos os seus habitantes venham a crer nele para a salvação.
Pode-se
olhar este trabalho pelo seu lado humano e também pelo seu lado divino. Ê até
necessário considerarmos todo o trabalho feito neste sentido como cm parte
trabalho nosso, cm parte trabalho feito por Deus. O evangelho que pregamos é
uma revelação divina. É da palavra de Deus que tiramos todo o material para
nossas pregações. Mas ainda a força eficaz para obrar a conversão dos que ouvem
vem do Espírito de Deus.
Quando
se trata da regeneração da alma, Deus é tudo e o homem não é nada.
Mas
igualmente é absoluta a necessidade do concurso dos homens para que qualquer
indivíduo ou nação se converta. "Vós sois o sal da terra". "Vós
sois a luz do inundo".
"Assim como o Pai me enviou a mim, assim eu vos enviei a vós." Por
estas e outras passagens iguais. Nosso Senhor declara a necessidade de esforços
humanos para que a conversão do mundo seja realizada.
Assim
o lavrador da terra tem de distinguir entre a parte que a Deus cabe, e a que
cabe a si mesmo. Ele vira a terra, a planta e a cultiva, mas as propriedades
da terra que a fazem produzir como também a chuva e o sol que concorrerem para
isso vêm de Deus. O homem trabalha. Deus o abençoa e a seu tempo se colhem os
frutos da terra.
Disto
vemos que é bom distinguir o lado humano de qualquer trabalho do seu lado
divino tanto em relação às causas deste mundo como as do reino de Cristo.
Tenho
agora em vista indicar os meios próprios para a conversão do Brasil. Deixando
de parte, por enquanto, a menção particular do modo por que Deus opera, quero
talar nos meios que Deus tem posto ao alcance de sua igreja e pelo uso dos
quais nós somos responsáveis perante o seu tribunal. Demos toda a atenção a
este assunto, pois é muito certo que toda a dúvida sobre os resultados desta
tentativa para a propagação do evangelho limita-se ao uso dos meios da nossa
parte. Deus não há de falhar nas suas promessas. A sua mão não é abreviada para
não poder salvar.
Ocupando-me,
pois, dos meios adequados à conversão das almas que em torno de nós morrem à
mingua do alimento, luz e forças espirituais, é evidente a necessidade
da pregação do Evangelho. Até seria fácil resumir tudo quanto se pode
avançar em relação à propagação da fé verdadeira, a pregação do Evangelho.
Em
primeiro lugar, a boa e santa vida de todo crente é uma pregação do Evangelho:
esta é a mais eficaz. Na falta desta pregação os demais meios empregados
não hão de ser bem-sucedidos. Os crentes são o sal da terra. A influência do
seu exemplo se propaga constantemente e torna-se irresistível. A um argumento
por melhor que seja, pode-se ao menos responder com um sofisma. Toda a pregação
feita por palavras, quer pronunciadas do púlpito quer impressas em uma folha ou
livro, pode ser rebatida por outras palavras. Mas uma vida santa não tem
réplica, A experiência de todos os tempos prova que o progresso do Evangelho
depende especialmente da conduta e vida dos que são professos. Há certas
árvores que não dão fruto, mas sempre morrem da mesma maneira. A podridão aparece
sempre primeiro no tronco e dali se estende lentamente para toda a parte até
que a árvore não podendo mais suster-se, cai por terra. É assim que qualquer
igreja definha e morre. O primeiro mau sinal é o arrefecimento do zelo de seus
membros e a falta dessa pregação do Evangelho que se faz por meio de uma vida
irrepreensível e santa.
Nós
que temos a nosso cargo pregar o Evangelho do púlpito corremos o risco a este
respeito. Debalde esperaremos colher frutos dos nossos trabalhos se as nossas
palavras não forem reforçadas e confirmadas por uma vida santa. A obra da
conversão do Brasil para o Evangelho muito depende do caráter dos ministros que
tiverem de pregar em nome de Cristo. A não ser que estes sejam animados de um
zelo puro e santo, ao contrário de nada aproveitará a sua pregação. Os que nos
ouvem, meus irmãos, tem razão para exigirem que a nossa vida continue aquilo
que ensinamos aos outros.
Quanto
aos membros das igrejas confiadas a nossa direção, devemos velar por sua
conduta, admoestando e aconselhando a todos a que adornem a sua profissão por
uma vida exemplar. Este dever requer paciência, mansidão e prudência a toda a prova,
como também a coragem e o zelo que nascem de uma consciência do dever solene
que temos de preencher.
Cuidemos,
pois, primeiro que tudo na pregação do Evangelho por meio de uma vida santa,
por meio da vigilância e oração, conservemos aceso o amor de Deus em nossos
próprios corações a fim de que possamos ser bem sucedidos em nossos esforços
para o bem dos que nos têm por seus pastores.
Outro
meio de pregar o Evangelho é a disseminação da Bíblia e de livros e folhetos
religiosos. Deste modo, pode-se dar notícias de Jesus a muitos que não querem
assistir ao culto público. Nesta época a imprensa é a arma poderosa para a
bem, ou para o mal. Devemos trabalhar para que se faça e se propague em toda a
parte uma literatura religiosa em que se possa beber a pura verdade ensinada na
Bíblia.
Há
diversos crentes ocupados neste serviço. São merecedores da nossa estima como
cooperadores. Devemos animá-los em seus trabalhos com nossos conselhos e
orações constantes. Porém todo crente deve ser induzido a fazer alguma coisa
neste sentido. O cristão evangélico que do princípio do ano até o fim não
espalha nenhum livro ou folheto nem folha, não tem convicção do seu dever.
Olhando
o futuro, temos aqui um vasto campo a percorrer. Ha sensível falta de bons
livros; atualmente não existem. É preciso que sejam feitos e depois de feitos,
distribuídos e vendidos.
Outro
meio de pregar o Evangelho ao alcance de todo crente é conversando com seus
amigos, conhecidos e vizinhos e trazendo-os ao culto público. Quando se lança
uma pedra em qualquer lago cujas águas não têm movimento, vê-se formar um
círculo onde ela caiu; esse círculo vai-se estendendo cada vez mais até que o
movimento que resultou do embate da pedra na água perde-se sobre a praia.
É
assim que o evangelho se propaga. Cada crente deve comunicar ao vizinho ou
próximo aquilo que recebe até que toda a sociedade seja transformada.
Cuidar
que toda a obra da conversão das almas fique a cargo dos ministros do Evangelho
a isto particularmente consagrados é um dos muitos prejuízos que devemos
combater com todas as nossas forças. Os cristãos primitivos não pensaram deste
modo. Cada um se esforçou para a propagação das boas novas da salvação. Cada um
tomou por modelo o apóstolo André, o qual apenas encontrou a Jesus e o
reconheceu pelo Salvador esperado, foi dizer a seu irmão Simão: "Nós temos
achado o Messias". Simão foi levado a Jesus e lambem creu nele.
Exortemos
aos crentes a que imitem este belo exemplo. Cada um procure a seu irmão a fim
de traze-lo a Jesus. Cada um por meio de suas conversas, orações e instâncias
faça o possível para o aumento do número dos servos de Deus. Existem já
bastante crentes, para que seus esforços unidos tenham grande importância.
Devemos estimular e dirigir estes esforços de maneira que sejam mais profícuos,
orando a Deus para que dê a todos os crentes os mesmos sentimentos e uma só
vontade no seu serviço.
Mas
convém que se faça menção particular da pregação do Evangelho por pessoas para
isso designadas e ordenadas. O Evangelho mesmo ordena que este ministério seja
confiado a pessoas de reconhecida aptidão e piedade, as quais não devem se
ocupar em outra coisa. Embora os membros de qualquer igreja sejam zelosos no
cumprimento dos seus deveres, não podem dispensar os serviços de um Pastor bem
instruído nas Escrituras e apto para ensinar publicamente. Estes requisitos nem
todos os crentes os tem. Este ministério requer estudo que poucos tem. Mais
ainda, requer prudência e abnegação e zelo que Deus só dá aos que vivem em sua
santa comunhão por meio de vigilância e oração constante.
À
vista da extensão do Brasil e das circunstâncias em que a igreja evangélica se
acha como se há de achar ministros em número suficiente para que em toda a
parte haja quem reparta o pão da vida eterna? É questão grave e difícil.
Porém,
abrindo o Evangelho mesmo, deparamos com um verso cuja leitura faz-nos
desvanecer todas as dúvidas a este respeito e nos indica a responsabilidade que
nos cabe. Jesus Cristo disse a seus discípulos: "Rogai ao Senhor da Seara
para que mande obreiros". O campo que cultivamos é do Senhor.
Nisto
temos uma garantia sólida. Compete ao Senhor mandar os obreiros. Aqui temos
outra garantia. A responsabilidade dos servos de Jesus não passa do emprego de
certos meios apontados. A oração é particularmente mencionada como meio
próprio a um de que esta terra extensa, já branquejando próxima à ceifa, seja
segada enquanto for tempo.
Ê
dever nosso não só orar neste sentido, mas instar com os membros de todas as
igrejas debaixo do governo do nosso Presbitério para que se lembrem de pedir ao
Senhor a graça de mandar ele mesmo obreiros para a sua seara.
Para
Deus nada é impossível. Ele sempre acha os instrumentos de que carece. Se ele
os quer de longe, não lhe faltará meios para trazê-los. Se ele os quer achar
perto, a seu tempo fará ver os seus escolhidos. Ele é capaz de fazer sair da
boca de crianças um louvor perfeito, ou se nem estas querem bendizer o Senhor
fará com que clamem as mesmas pedras.
Porem
a escolha e a vocação de Deus não tomam desnecessários os nossos esforços. Se
estes obreiros vêm de países estrangeiros são obrigados a aprender uma nova
língua e acostumar-se aos usos de uma nova terra. Este fato de per si faz crer
que a maior parle dos obreiros no Brasil tem de ser do país.
Toda
a experiência prova que Deus não vai longe em procura de seus instrumentos. Se
não os acha já prontos à sua mão, ele os cria.
Mas
ele os cria conforme um plano sabido e já executado em muitas partes do mundo.
Pela pregação do Evangelho chama os seus escolhidos. Por seu Espirito os
ilumina e regenera e converte. Mas isto não é tudo. Nem todo cristão zeloso é
apto para ensinar a seus semelhantes da cadeira evangélica. Por mais forte que
seja a vontade de anunciar as boas novas de salvação a todo o mundo, sem
estudos e a prática de falar, não pode fazê-lo com bom êxito. Não há dúvida.
Deus pode por meio de dons extraordinários converter pescadores em Apóstolos
sem intervenção de escolas nem livros. Aqui não se trata do poder de Deus. Sabemos
que para o Senhor nada é impossível. A nossa tarefa se limita ao estudo do
plano que ele de fato se digna seguir na escolha e preparação de seus
instrumentos. A conclusão a que chegamos é que na falta dos dons
extraordinários tais como o dom das línguas e o da inspiração divina é forçoso
haver escolas, livros e mestres. Aqueles que mostrarem alguma vontade e
aptidão para serem ministros da palavra de Deus, deverão ser provados e
desenvolvidos por estudos próprios para este fim.
Neste
século importa que os ministros de Cristo sejam instruídos não só nas doutrinas
da salvação, mas também nas ciências, a fim de que sejam capazes de dar uma
razão de sua fé em resposta aos que contradisserem a verdade. Todo o
conhecimento é útil para o pregador do Evangelho, e quanto é possível,
devemos esforçarmo-nos para não ficar aquém dos que nos rodeiam São Paulo foi
instruído em todos os conhecimentos da sua época a ele coube o dever de
explicar com a maior perfeição os grandes dogmas da fé de Cristo. Em todos os
séculos os servos mais influentes e mais úteis tinham além dos dotes superiores
da inteligência estudos profundos e longos.
Outro
meio indispensável para assegurar o futuro da igreja evangélica no Brasil é o
estabelecimento de escolas para os filhos desses membros. Em outros países é
reconhecida a superioridade intelectual e moral da população que procura as
igrejas evangélicas. O evangelho dá estimulo a todas as faculdades do homem e o
leva a fazer maiores esforços para avantajar-se na senda do progresso. Se
assim não suceder entre nós a culpa será nossa. Se a nova geração não for superior
à atual não teremos preenchido nosso dever.
É
de confessar que a educação há de encontrar grandes obstáculos provenientes de
muitas causas. Muitos pais são descuidados a este respeito, nem querem fazer os
sacrifícios precisos para educarem seus filhos Estes da sua parte não estando
acostumados a obedecerem a seus pais não gostam do regime de uma escola bem
dirigida. Os costumes do país e a falta de confiança e moralidade não permitem
que uma escola central seja frequentada por todos como sucede nos Estados
Unidos. Faltam professores e professoras com a prática necessária para bem
desempenharem esta missão e o governo ainda não admite a instrução livre. Mas
é necessário não cedermos a nenhum obstáculo. Embora não seja possível desde já
fazer o que se quer, devemos ter sempre em vista como alvo a instrução e
educação da nova geração. Sendo este meio indispensável temos razão em esperar
que Deus nos deparará os meios de atingi-lo.
Terminando
esta indicação dos meios próprios para plantar o Reino de Cristo no Brasil, não
posso deixar de acrescentar mais outra consideração.
O
resultado do emprego destes meios, como também as forças precisas, dependem de
Deus. Ficarmos no emprego dos meios sem pedir a Deus que opere por eles e com
eles seria um erro fatal.
Nada
devemos empreender sem suplicar a Deus que envie do alto o seu Espírito para
assegurar-nos êxito. Por conseguinte, a oração é a condição indispensável a fim
de que possamos sair bem da empresa aqui encetada. A oração do justo, sendo
fervorosa, pode muito. Se Deus é por nós, quem será contra nós?
O
meio de nos assegurai da presença de Deus é a oração
Vigiemos,
oremos e trabalhemos, e Deus velará por nós e por sua igreja.
Referência Bibliográfica
SIMONTON, A. B. O diário de Simonton – 1852-1866. 2ª
ed. revisada e ampliada com mapas e fotos. São Paulo: Editora Cultura Cristã,
2002.
[1] Rev. James Cooley Fletcher atuou como
missionário no Brasil entre 1851-1869, com intervalos em que retorna aos
Estados Unidos por diversas razões. Apesar de não ser devidamente reconhecido
na bibliografia histórica presbiteriana, ele foi um pioneiro e contribuiu de
forma consistente para a implantação do protestantismo no Brasil. cf. http://historiologiaprotestante.blogspot.com.br/2013/10/fichario-biografia-james-cooley-fletcher.html
[2] O presente trabalho encontra-se em manuscrito
na caligrafia do Rev. Modesto Perestrello Barros de Carvalhosa, encadernado com
Relatório ao Presbitério do Rio de Janeiro, no Arquivo Presbiteriano. A ortografia
foi atualizada.
Nenhum comentário:
Postar um comentário