Quando em 1875 a igreja em Cachoeira (BA) foi organizada pelos missionários
Francis Schneider Houston, Cachoeira era um dos cinco ou seis municípios do
Estado [da Bahia] mais importante depois da capital. Quando possível, convém
situar a das igrejas no contexto em que estão situadas, e assim constatar os
vínculos, as atuações das igrejas como sal e luz da terra. Cachoeira possui um
currículo que vale a pena conhecer. Situada a cento e vinte quilômetros de Salvador,
ostenta o título oficial de “Cidade Monumento Nacional” e o de “Cidade Heroica”,
por suas lutas em favor da Independência do Brasil. Tornou-se capital do Estado
durante dezesseis meses, na época da Bahia Independente e da Revolta da
Sabinada, insurreição encabeçada pelo médico e professor Francisco Sabino
Álvares da Rocha Vieira, em 1837, contrária ao modelo de independência vigente
na menoridade de Dom Pedro II, e visava a separação do Império e a instalação
de um governo republicano. Terra de Antônio
de Castro Alves, renomado poeta e abolicionista, nascido na fazenda em
Curralinho, hoje Castro Alves, comarca de Cachoeira. A fazenda pertencia à
localidade de Muritiba, hoje município, onde, na luta pela Independência, o
major José Antônio da Silva Castro, avô de Castro Alves, organizou um batalhão
de setecentos homens, entre os quais o mais valente era um “disfarçado”; depois
descobriram que era uma mulher, Maria
Quitéria. Castro Alves pertenceu à terceira geração da poesia romântica ou
condoreira. O poeta Manuel Bandeira dizia que Castro Alves tinha a mente
borbulhante do gênio, a maior força verbal e a inspiração mais generosa de toda
a poesia brasileira. Cachoeira é ainda terra natal do engenheiro e
abolicionista André Rebouças e de Ana Néri, enfermeira que tão relevantes
serviços prestou na Guerra do Paraguai.
O evangelho em Cachoeira
Uma das cidades mais desenvolvidas da Bahia, a fama de Cachoeira despertou
nos missionários o interesse de levar a mensagem à cidade, ate então dominada
totalmente pelo romanismo e fechada para o protestantismo. Não foi possível
levantar informes precisos sobre o começo do trabalho em Cachoeira. Fato certo
é que já existiam, na cidade, crentes quando os Revs. Francis Schneider e James
Houston organizaram a igreja, em setembro de 1875. Não há precisão também
quanto ao dia em setembro, nem como foi a organização, primeiros oficiais e
outros atos. Uma publicação de aniversário da igreja diz: “Infelizmente não temos o livro de atas que
registrou a organização da igreja, e isso se dá em razão das constantes cheias
do Rio Paraguaçu, que foram responsáveis por perdas irreparáveis de alguns
documentos históricos de nossa igreja”. Mediante atas da igreja da Bahia,
verificadas pelo presbítero Eudaldo Andrade Costa, sabe-se que, nos primeiros
anos, eram pastores da igreja de Cachoeira os mesmos da igreja da Bahia.
Cachoeira foi, portanto, a segunda igreja fundada na Bahia e também a segunda
em toda a extensão do Nordeste e do Norte. Apesar de rejeições e retaliações
romanas, várias congregações e igrejas surgiram no Recôncavo Baiano. Dentre elas as congregações de Engenho Velho da
Vitória, São Gonçalo dos Campos, Cruz das Almas, Conceição de Faria, Governador
Mangabeira, Santiago do Iguape, Santo Amaro, Morro do Chapéu e Muritiba. Esta
última consta existir desde 1934. Informações chegadas da igreja afirmam que
ela na verdade tinha começado em São Felix, e que era doze o número de membros
que a formaram.
Grande luta inicial para conseguir um local de reuniões. Na época era
proibido às igrejas acatólicas em todo o território nacional construir casas de
cultos cm forma de templo. Ademais, não havia recursos financeiros e a igreja,
por algum tempo, reuniu-se em residências. Depois alugou um imóvel na Rua das
Flores, atualmente Prisco Paraíso. Em 1901, a Intendência Municipal doou um
terreno, mas o local, às margens do rio Paraguaçu, era muito difícil para se
construir, pois havia necessidade de muito material de aterro. Com muito
esforço, a igreja construiu e inaugurou o templo em 1903, onde até hoje a
igreja se reúne, na Praça Ubaldino de Assis. O Rev. Chamberlain era o pastor da
época e o projeto de construção foi elaborado e executado pelo Rev. William
Wadell, engenheiro e pastor da igreja da Bahia. Mestre de obras, José Martins
Alves, pertencente a uma das mais antigas famílias da igreja da capital. Quando
inaugurado o templo, era de noventa e sete o número de membros arrolados. A
igreja prosseguiu na luta pela salvação de almas, tinha já Mesa
Administrativa, correspondente ao Conselho, desde 1895, dirigida pelo Rev.
Chamberlain. Os presbíteros Francisco David de Magno, Hermelino Ferreira Silva
e Agripino Costa Timbeiro eram primeiro e segundo secretários e tesoureiro,
respectivamente.
A igreja ia muito bem, mas o prédio onde se reunia, não. Diversas vezes
causou transtornos. Mesmo as melhores estruturas desmoronam ante a corrosão,
solapamento, enchentes e vendavais. No dia 26 de outubro de 1906, o templo
desabou por inteiro e seis pessoas ficaram feridas e hospitalizadas. O então
pastor, Henry John McCall, estava para viajar aos Estados Unidos e adiou a
viagem para ajudar na reconstrução do templo. Num período de meses, a igreja
reuniu-se na Escola América, em São Félix. Com as periódicas, mas certas
enchentes do rio Paraguaçu, outras ocorrências foram registradas e danificaram
o templo. Em 1960, o assoalho não resistiu e completamente, e em 1989,
contrariando as mais experientes previsões, águas invadiram totalmente o templo
e causaram estragos enormes.
Pastores da igreja
Como já dito, os primeiros pastores eram os mesmos da igreja da Bahia,
mas a partir de 1901 outros chegaram. O Rev. Chamberlain, após a amarga experiência
em Feira de Santana, passou a residir e fazer de São Félix e Cachoeira a sede
de seu campo missionário, de 1889 a 1902. Pastoreou a igreja de Cachoeira, mas em 1902 seguiu para os Estados
Unidos em busca de cura para o câncer. Não teve jeito e pediu que o trouxessem
de volta Brasil onde desejava ser sepultado. À beira da morte, visitou
Cachoeira pela última vez, e faleceu na casa do filho Pierce, em Salvador, no
dia 31 de julho de 1902. Segundo Alderi Matos, nesse mesmo dia chegou a
Cachoeira, para pastorear a igreja, o Rev. John McCall, que permaneceu na
cidade ase 1908; em fevereiro de 1903 a Junta de Nova York designou-o para todo
o campo com base em Cachoeira. Alderi Matos conta que, ao chegar de viagem
pastoral pelo campo, em 1904, McCall encontrou pregando no púlpito de Cachoeira
o Rev. Álvaro Reis. Mesmo com traje de viagens, as botas meladas de barro,
correu para abraçar o célebre pastor da igreja do Rio de Janeiro.
Além do ministério de pregação, a igreja sempre acudiu com víveres a
comunidade carente da cidade. A Escola Presbiteriana, com o nome de Simonton,
foi fundada como educandário modelar para crianças e jovens de Cachoeira, com
ensino segundo as necessidades de preparo dos alunos para a vida, mas sob a
ética dos ensinos de Cristo, para esta vida e para a eternidade.
Pastorearam a igreja, além dos mencionados, os Revs. José Ozias
Gonçalves, Salomão Ferraz, Augusto Dourado, Manoel A. da Silva, Sérgio
Maranhão, Jerônimo Rocha, Milton Ribeiro, Sebastião Gomes, Rodger V. Perkins,
Richard Wadell, Sebastião Elias da Silva, Lafaiete Pereira Rocha. Adalto
Magalhães, Joel R. Cavalcante, Geraldo Nobre, Milton Loula Dourado, João Dias
de Araújo, Laudionor Vieira, José Walmir Lafene, Vicente Cardoso Péricles
Evangelista, Caetano Athaide, Josadak Bezerra, Everaldo Porto e Leandro Souza
Cruz de Andrade.
Utilização livre desde que citando a fonte
Professor Caleb Soares
Historiador
Mestre em Letras
Mestrando em Teologia
Fundador e Presidente do
Instituto de Pedagogia Cristã (IPC)
Referência Bibliográfica
SOARES, Caleb. 150 anos de paixão missionária
– o presbiterianismo no Brasil. Santos (SP): Instituto de Pedagogia
Cristã, 2009.
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